"Governo promete aumento de impostos" diz o Correio da Manhã em letras gigantes. A "conclusão" é baseada nas estimativas do peso da carga fiscal -que constam do PEC - que têm variações na ordem dos 0,1 e 0,2 pontos percentuais.
Primeiro de tudo é ridículo dar qualquer importância a variações deste tamanho, especialmente neste caso em que se trata de previsões. Segundo a notícia, a variação de 2007 para 2009 será de -1.5pp, o que mostra o quão insignificantes são aqueles valores.
Segundo, o CM "confunde" na capa - mas já não o faz no corpo do texto - carga fiscal com o nível dos impostos. Se eu este ano decidir comprar pastéis de camarão em vez de pastéis de vegetais, estou a pagar mais IVA (os primeiros têm um IVA maior), ou seja estou a aumentar a minha "carga fiscal". O que é que o Correio da Manhã vê ali? Uma alteração do consumo? Não, um aumento dos impostos!
Outro exemplo, se houver menos gente a fugir aos impostos, o CM não vê nisso uma redução da fuga ao fisco, mas um aumento de impostos!
Por último, um apontamento tragicómico. As receitas fiscais dos impostos directos (em percentagem do PIB) vão ter - segundo o texto - o seguinte comportamento: 9,8%, 9,6% e 9,7%. Há ali primeiro uma redução e depois um aumento, metade da redução (ambos totalmente insiginificantes como já disse). O que é que o parágrafo introdutório diz? "[O PEC...] deixa claro que os impostos directos e indirectos vão aumentar nos próximos dois anos." Não interessa o comportamento geral, interessa é que lá pelo meio haja uma subida.
Caro Miguel: Quando dizes que o CM "não vê" estás a ser condescendente.
Ambos sabemos que o CM, assim como toda a restante comunicação social, quer é notícias más para dar, mesmo que para isso haja que torcer a realidade.
Há de facto muitas notícias más para dar - a produtividade que não aumenta, gastamos mais do que produzimos, etc, - mas dar manteiga ao estimável público e pôr as culpas para o governo - seja ele qual for - dá mais pica.
Não adianta esperar seriedade desta gente! Mas não desistamos nós de a expôr.
De Anónimo a 13 de Fevereiro de 2009 às 18:19
Sou jornalista. Oscar, se tem esse preconceito em relação a toda a comunicação social, fico sem esperar grande coisa dos seus posts, incluindo seriedade.
Caro anónimo;
Peço desculpa! Não devia ter generalizado.
Mas com genuino desejo de não faltar à verdade, acho que posso dizer que em todos os jornais já verificámos, embora com graduações diferentes, esta falta de seriedade. Notícias boas que são escamoteadas, notícias más empoladas.
Na minha juventude, um dos meus grandes prazeres era ir ao fim da tarde para o café ler os jornais (Ainda havia censura...). Hoje, dono do meu tempo, quiz voltar a esso velho prazer, tentei e desisiti, porque ficava irritado com a forma deturpada como as notícias eram apresentadas.
Junto à banca dos jornais, ouço os velhos reformados comentar os títulos: "Mais um que se encheu..., Outro que levou uma reforma choruda,... Esta cambada de políticos anda tudo ao mesmo!" Frases feitas que me deixam triste!
São generalizações insuportáveis!
Karl Popper chama teoria da "conspiração da sociedade" esta teoria (e cito:) acrítica de que a guerra, a miséria e o desemprego são as consequências de propósitos pérfidos e de planos tenebrosos,..., quando algo de mal acontece neste mundo alguém deve ser responsável, (etc...)
Custa-me ver as pessoas não tomarem nas suas mão os seus destinos, e preferirem participar neste festim de mal dicência: Estou na "merda" porque causa destes "gajos".
Não defendo a censura, defendo a verdade. Não milito em nenhum partido político. Se hoje é Sócrates o mais atacado, há anos foi Cavaco Silva, amanhã será quem for. É irrelevante.
A comunicação social (e não sei nada de nada desta profissão) tem a responsabilidade de informar os cidadãos do que é mau e do que é bom. De nos formar. De dar meios para que as pessoas formem as suas opiniões baseadas em factos.
Claro que os jornalistas não estão sós nesta deturpação do real.
Os políticos também o fazem. Mas a demagogia devia ser desmascarada pela comunicação social com rigor. E, aqui uma vez mais o que vejo é a comunicação social escamotear ou empolar, consoante o interesse do jornal. É a minha percepção! Como cliente da Com.Soc. tenho direito a ela, como tese teria que fundamentá-la.
Acho que não deve esperar grande coisa dos meus posts - representam na maioria das vezes desabafos escritos no auge de alguma irritação.
Mas da minha seriedade agradeço que não duvide. Ou pelo menos da seriedade do esforço que faço para ser sério.
De
Ricardo S a 13 de Fevereiro de 2009 às 14:19
Como os portugueses gostam é de tragedias e de ver sangue, á natural que os jornais lhes façam a vontade, oferecendo-lhes negativismo e pessimismo às doses.
Estive para fazer um post sobre uma noticia do Sol de quarta-feira, mas deixo-a para voces, já que se trata de uma pessima utilizaçao de numeros.
O link da noticia é este:
http://sol.sapo.pt/PaginaInicial/Sociedade/Interior.aspx?content_id=125918
"Trinta e nove por cento dos médicos oncologistas defendem a legalização da eutanásia, mas a percentagem que admite fazê-lo é de 23 por cento, segundo um estudo de 2007 da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP)", podemos ler. Mas é o unico numero que surge no texto. E qual é o numero dos que sao contra? E dos que nao sabem?
O titulo, como nao poderia deixar de ser, é "Apenas 37% dos oncologistas defendem eutanásia"
"Apenas"! Isto diz tudo do objectivo da noticia...
Abraço.
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