Quarta-feira, 31 de Outubro de 2007
Notícia da Lusa republicada no Diário Digital
(...)os portugueses queixam-se de ordenados curtos para fazer frente às despesas e de terem de se privar de alguns bens de primeira necessidade, como a comida, vendo-se obrigados a recorrer a créditos.
Actualmente, os portugueses já não poupam para fazer frente a eventuais despesas surpresa, mas para conseguir subsistir durante o mês.
Actualmente??? Ou como também se diz no texto "
hoje em dia"... Insisto no que escrevi
aqui. O país está a passar por uma grave crise de desemprego, mas os salários reais raramente foram tão altos como hoje. Desafio alguém a a fazer uma lista de 5 anos desde 1143, nos quais os salários reais fossem mais altos do que hoje. Salário médio ou salário mínimo, tanto faz.
Mais à frente na notícia temos uma possível explicação para esta notícia sensacionalista que todos os anos deve aparecer na nossa imprensa (desde que ela existe):
«
Hoje em dia não se consegue poupar. Para já não há uma educação de poupança, depois a inflação e o nível de salários não permitem poupar, porque estamos a ser sempre constantemente confrontados com o marketing e nós queremos sempre as coisas que nos entram em casa»
Ah.
Terça-feira, 30 de Outubro de 2007
Sob o título
Justiça contra Viana Polis no processo Coutinho o jornalista Paulo Julião
DN comete um erro muito comum (propositadamente?) no que toca às providências cautelares. Curiosamente no caso Coutinho em Viana do Castelo têm abundado este tipo de erros. O texto acaba por explicar a situação, mas o título aponta num sentido completamente diferente.
Havendo a vontade da Viana Polis em demolir o edifício, houve vários moradores que apresentaram providências cautelares contra. Estas foram aceites e serão portanto levadas a julgamento. A Viana Polis pediu recurso de modo a poder demolir já o edifício. Estando o caso principal ainda em julgamento, o tribunal decidiu que não podia aceitar este recurso, porque ao autorizar a demolição estaria a partir do princípio que a Viana Polis já ganhou o processo principal, sobrepondo-se portanto à decisão judicial desse processo.
Trata-se portanto apenas de uma decisão a favor do bom funcionamento do sistema jurídico, não tocando sequer a legalidade da questão fulcral, a da demolição.
O título é portanto abusivo.
Segunda-feira, 29 de Outubro de 2007
O caderno de economia do Expresso do passado Sábado também nos fala de petróleo. A página 2 fala-nos da alta do seu preço, da alta das expectativas sobre o seu preço, de "barreiras psicológicas" e de outras coisas más. Isto em dólares e do ponto de vista da economia americana. Nada a objectar. A página 3 fala-nos de formas de contornar a alta do preço do petróleo, de alternativas ao próprio petróleo e de outros truques úteis. Isto em euros e do ponto de vista do consumidor português. Nada a objectar. O que tenho a objectar é esta passagem da página 2 para a 3 assim, sem mais nem menos, com atropelos da taxa de câmbio pelo caminho, como já foi, aliás, comentado
aqui,
aqui e
aqui.
Euro e petróleo iniciam semana sobre máximos históricos diz o Diário Digital. O ouro e o cobre também sobem.Sendo que não há nenhuma razão forte para que o valor real do Euro, do petróleo, do ouro e do cobre estejam relacionados entre si, isto trata-se de uma enorme coincidência! Algo que acontece com 0,001% de probabilidade. Tratando-se da 20ª vez que se lê esta notícia nos últimos tempos, estamos a falar de uma coincidência ainda maior, algo com 0,0000000000000000000001% de probabilidade de acontecer.Ou será que é o dólar que está continuamente a ser desvalorizado, e os jornalistas não compreendem que o dólar não é uma moeda de referência absoluta (e cada vez o é menos)? Uhm... Isso parece-me altamente improvável.
Domingo, 28 de Outubro de 2007
O DN de ontem, sob o título “Privados garantem que ensinam melhor por menos”, dá voz a alguns responsáveis de associações ligadas ao ensino particular e cooperativo (vá lá, ficou de fora o concordatário...) que argumentam dever o Estado dar “liberdade de escolha” às familias quanto aos estabelecimentos de ensino que os filhos frequentam, sejam estes públicos ou privados, “assegurando depois o financiamento integral das aprendizagens”. Vamos por partes: primeiro o verdadeiro ‘pedido’ ao Estado e depois os argumentos usados para o justificarem.
A escola pública, ao que parece, ensina mal e ensina mal por mais caro. E, portanto, o Estado deve dar liberdade de escolha às familias. Mas esperem lá, então quem já tem actualmente os filhos em escolas privadas está a desobedecer ao Estado porque tomou a liberdade de não escolher escolas públicas? E quem escolheu escolas públicas (se é que ‘escolheu’), está a obedecer ao Estado? As respostas são óbvias para estar a gastar caracteres. A verdade é que se usa o estandarte da “liberdade de escolha” para pedir... dinheiro ao Estado!
Note-se, o meu ponto nada tem que ver com ideologias político-económicas (nenhuma me interessa aqui). Simplesmente, é dada voz num jornal ‘de referência’ sem haver lugar a qualquer contraditório, isto é, sem que passe pela cabeça de alguns jornalistas uma perguntazinha sequer a rebater o que é dito. Bom, se não passa, e acredito que não passe, então vamos aos argumentos, que esses é que são bons.
O ponto de partida está nos rankings das escolas, os quais se baseiam, ao que parece, pelo que é dado a entender no artigo, na média dos resultados dos exames a Português e a Matemática. “De acordo com cálculos feitos pelo DN”, as privadas obtiveram, em média, 3,45 a Português, contra os 3,21 das públicas. Mas “a diferença foi ainda mais significativa” a Matemática: em média, 2,59 para as privadas contra 2,11 para as públicas. Eu pergunto:
1. Quando se diz que estas diferenças foram (são?) significativas, está a usar-se o termo estatisticamente ou de forma literária? É que se é estatisticamente, então cabe informar para que nível de confiança são essas diferenças significativas? Para 1%? Para 5%? Para 10%? É que as diferenças, entre usar uns ou outros níveis de confiança, são significativas (forma literária!). Se o termo está a ser usado de forma literária, então a comparação pode ser oca e não servir para nada se as diferenças forem estatisticamente não significativas. (Dado que a dimensão das duas amostras – número de alunos nas públicas e privadas – é provavelmente grande, não surpreende se as diferenças forem, de facto, estatisticamente significativas; mesmo assim...)
2. Então, focando-nos na média, como tanto se gosta de fazer e é o que se faz no artigo, a Português, tanto as privadas como as públicas conseguem a mesma positiva (média de três, já que a média das privadas não chega para arredondar para o quatro, mas nem queria entrar por aí). E, ainda focando-nos na média, a Matemática, tanto o privado como o público, ‘conseguem’ ter negativa (embora, arrendondado, o privado consiga três). Como se sabe, nas pautas aparece um 3 ou um 2, sem casas decimais, e é isso que interessa aos alunos e é isso que interessa para passar ou chumbar (oops, ‘reprovar’; oops, ‘ficar retido’) a uma disciplina (depois de, com a nota interna, calcular a média ponderada). Estamos então a falar de casas decimais para sustentar o argumento da liberdade de escolha e o financiamento integral das aprendizagens por parte do Estado? É que, ao que parece, às unidades, privado e público estão a fazer igualmente bem e a fazer igualmente mal.
3. Por favor, há alguém em Portugal que pegue em dados da performance das escolas (privadas e públicas) com um horizonte temporal razoável, e estude de uma vez por todas o efeito-escola sobre o efeito-aluno, controlando para factores socio-económicos, culturais, etc? Como é sabido, a população estudantil nas privadas é, apesar dos esforços para o contradizer, muito mais homogénea que a população estudantil nas públicas, a qual se caracterizará, porventura bem, por uma perfeita ‘salganhada’. Ou seja, indirectamente, estou a dizer que interessa não só olhar para a média (já estamos habituados a falar dela e quase toda a gente a sabe calcular), mas também para a variância dos resultados nas escolas. Estou em crer que essa variância é (significativamente?) maior nas públicas do que nas privadas. Ora, a média é uma medida de tendência central que é afectada por extremos. Ah, então... Pois.
A educação é uma paixão em Portugal e por isso vende. Votos e jornais. E onde está um projecto de investigação global sobre a educação em Portugal? Ah, espera, isso não dá votos e não vende jornais... (e as universidades, onde andam?) Haja, ao menos, (mais) rigor.
Sexta-feira, 26 de Outubro de 2007
As faltas dos alunos do ensino básico e secundário vão deixar de ter consequências.
Assim mesmo.
Sem mas nem meio mas.
No topo da capa de hoje.
Lá dentro já se lê no texto de Filomena Fontes e Margarida Gomes que afinal...
...deixam de ter consequências, a não ser a realização de uma ou várias provas de recuperação para os estudantes que excedam os limites de faltas definidos por lei.
Será que existe algum aluno do ensino básico ou secundário que ache que um exame extra é o mesmo que nada?
Nota: Como sempre não estou a defender a medida, apenas a notar a vergonhosa ausência de rigor do Público
Quinta-feira, 25 de Outubro de 2007
A comunicação social dá hoje destaque a mais um aumento dos lucros da banca, "
Lucros do BES sobem 60 por cento nos nove primeiros meses" diz o Público. Apesar desta variação ser quase sempre dada em percentagem, esta medida pouco nos informa sobre a realidade. Um exemplo:
Banco A: de 100€ de prejuízo passou para 100€ de lucro
Banco B: o lucro subiu de 100 para 150€
Banco C: o lucro subiu de 1€ para 11€
Assumindo que os bancos têm a mesma dimensão para não complicar, julgo que todos concordamos que o banco com melhor variação de desempenho é o banco A, seguido do banco B e por último do banco C, que apenas teve um aumento de 10€. Agora as percentagens:
Banco A: -200%
Banco B: +50%
Banco C: +1000%
As percentagens indicam-nos exactamente o contrário!
Quarta-feira, 24 de Outubro de 2007
Os eventuais perigos dos postes eléctricos de alta tensão voltaram à baila nas últimas semanas. Se a comunidade científica ainda não tem consensos quanto a isto, não serei certamente eu que vou acrescentar alguma coisa.
Bem, não resisto a apontar que um estudo que "prove" que quem mora mais perto de postes alta tensão tem maior propensão a problemas saúde, não prova quase nada. Tal como Jorge Buescu (julgo ter sido num livro dele que isto é referido) afirma, há aqui um problema se enviesamento da amostra: quem mora junto aos postes de alta tensão não constitui uma amostra aleatória da população em geral. Geralmente os postes passam em zonas afastadas dos centros urbanos, ou seja zonas com habitação mais barata. À partida estaremos a falar de pessoas com menos rendimento e portanto com menos acesso a cuidados de saúde, logo é de esperar que tenham à partida mais problemas de saúde.
Agora não posso deixar de notar que nas televisões se contam histórias de famílias que morando junto a postes de alta tensão, tiveram vários problemas oncológicos, sendo a sua origem atribuida aos campos electromagnéticos. Que as pessoas acreditem nisso, é uma coisa. Agora as televisões não deveriam ser sensacionalistas e alarmistas e passar esta mensagem. Ouvem-se barbaridades como "
já houve N mortes aqui no bairro por causa dos postes". Aqui fica um
exemplo no DN.
Por isso pergunto: será que estas pessoas seriam imortais na ausência dos postes? Será que quem mora longe dos postes não tem cancro? Será que não havia cancro antes da massificação das redes eléctricas?
Parece que o DESTAK não quiz ficar atrás do METRO, e insiste também no velho paradigma da galinha da estatística, colocando este título na primeira página.
(Lembram-se? Se uma pessoa come uma galinha e a outra não come nada, estatisticamente cada uma come meia galinha. )
João Moniz, é o autor da frase, ao que diz, citando o fiscalista Caiado Guerreiro. Embevecido, o jornalista ainda faz outra citação do mesmo autor: “Sem controlo na despesa, o governo tem diminuído o défice com o aumento da carga fiscal”.
Assim “tout court”....
Este é o título de um artigo de Joé Júdice no Jornal METRO.
Pegando no (já estafado) mote, da dívida do filho do Engº Jardim Gonçalves, ao BCP, o autor, faz o rol daquilo que cada português paga ao Estado. E afirma:
Cada português – incluindo os pobres - paga 70 euros por ano para manter a RTP, 14 euros para a derrapagem no custo das obras do Túnel o Rossio, 12 euros para os sobrecustos das obras do Metro no Terreiro o Paço, 10 euros para o Estádio do Braga, etc. etc...
Caro José Júdice: De certeza que sabe, que não é correcto fazer a divisão dos custos referidos pelo número total de portugueses, porque na realidade, eles não pagam todos o mesmo. Há mesmo alguns portugueses que recebem mais do Estado do que aquilo que pagam (E é justo que assim seja!). Portanto as afirmações que faz carecem de rigor.
Se estava apenas a querer fazer um efeito literário, uma ironia, um chiste, peço desculpa.