(mais um artigo, desta feita publicado a 13 de Março de 2007 no então 'Economia' do DN pelo mesmo autor, aqui republicado a fazer novamente jus à génese do 'A Pente-Fino')
A manifestação contra as políticas PS organizada pela CGTP no passado dia 2 foi considerada "a maior de todos os tempos", reunindo em Lisboa 120 mil pessoas (dados da PSP). No entanto, o Barómetro da Marktest uma semana antes e o estudo da Eurosondagem no mesmo dia da manifestação, revelavam (1) que as intenções de voto reforçam a maioria absoluta ao PS e (2) a enorme popularidade de José Socrates. Existirá aqui, como sugerem algumas opiniões, algum paradoxo? Analisemos então os dois factos à luz dos conceitos de aleatoriedade e representatividade.
A manifestação não é aleatória, ou seja, os manifestantes não foram (e em rigor nem o podiam ser) escolhidos aleatoriamente. A este respeito, há a considerar, entre outros, um problema de auto-selecção, isto é, existem pessoas com maior motivação e em melhores condições (mais tempo, p.ex.) para participar em manifestações do que outras. Desde logo, reformados e desempregados, e ainda os que estarão sempre disponíveis para qualquer manifestação seja ela qual for, seja porque daí retiram algum prazer ou, como neste caso, por fidelidade/compromisso sindical. E a manifestação não é representativa da população portuguesa, activa ou não. Não o é em termos geográficos nem em termos de estratos sociodemográficos. E afectando ambos, claramente, não o é também em termos políticos: foi uma manifestação da CGTP, a Intersindical apoiada pelo PCP.
Quanto às sondagens, apesar da sua suposta garantia de aleatoriedade, esta não é perfeita. Se mais razões não houvesse, tome-se apenas o simples facto de as listas de onde são escolhidos os entrevistados conterem erros. Ou seja, os portugueses não têm todos a mesma probabilidade de serem seleccionados para a amostra. No entanto, parte desta imperfeição nas sondagens é tida em conta no cálculo do erro amostral e na estipulação de um intervalo de confiança. Mas o mais importante é que as sondagens (ou qualquer estudo baseado numa amostra) sejam representativas da população em análise. E à partida não existe razão para se suspeitar que o não são.
Assim, não parece existir aqui nenhum paradoxo. Não, como erradamente se possa pensar, por uma diferença na magnitude dos números, isto é, o facto de 120 mil manifestantes serem uma minoria quando comparados com o total de portugueses, mas por uma diferença no que os números representam. Os manifestantes não são representativos da população portuguesa (nem aleatórios), enquanto as sondagens, mesmo que baseadas num número de entrevistas incomparavelmente menor - cerca de mil -, assentam em pressupostos estatísticos que permitem generalizar os resultados amostrais para a população em causa.
Se deve ou não prestar-se atenção a qualquer um dos factos e quais as ilações que deles se podem retirar, essas são outras questões.
(artigo publicado a 5 de Setembro de 2006 no então 'Economia' do DN pelo mesmo autor, aqui republicado a fazer jus à génese do 'A Pente-Fino')
Na passada sexta-feira, a primeira página do DN tinha a seguinte manchete: "Exames fazem disparar reprovações no 9.º ano", referindo-se ao ano lectivo 2004/05 em comparação com 2003/04. Vejamos se assim é.
Desde o ano passado, os alunos do 9.º ano têm de fazer exame nacional a Língua Portuguesa e a Matemática, a nota do qual (de 0 a 100%) é convertida para uma escala de 1 a 5 segundo uma tabela definida pela tutela. É esta classificação do exame (de 1 a 5) que em 2004/05 teve um peso de 25% na nota final daquelas duas disciplinas e que este ano pesa 30% (o restante é a nota do 3.º período). Assim, um aluno reprova no 9.º ano se tiver a) nota final inferior a 3 a Língua Portuguesa e Matemática, ou b) nota final inferior a 3 em três disciplinas, ou c) em duas disciplinas (que não aquelas duas em simultâneo) e Não satisfaz na área de projecto.
Ora, acontece que em 2004/05 os exames do 9.º ano, a valerem 25%, não podem ter reprovado ninguém, simplesmente porque ninguém com positiva no 3.º período (3 a 5) passa a negativa por causa do exame. Quem tem um 3 no 3.º período, mesmo que tenha 1 no exame, fica com 2,5 como nota final, o que arrendondado dá 3 e o aluno não reprova.
Para os melhores alunos, de 4 e 5, o máximo que lhes poderá acontecer é descer um valor. Segundo o relatório do Gave sobre os resultados da 1.ª chamada do exame de Matemática, p. ex., em 2005, a grande maioria dos alunos com 4 e 5 no 3.º período obteve 3 ou mais no exame, conservando assim a sua nota interna. Raros foram os alunos com 4 que obtiveram 1 no exame (nenhum aluno com 5 obteve 1), descendo assim a sua nota final para 3.
Os exames, a valerem 25% (ou 30%), eventualmente até ajudam a passar de ano. Aos alunos com 2 no 3.º período (em vias de reprovarem), os exames permitem chegar ao 3 caso obtenham 4 ou 5 no exame, o que em 2005 não aconteceu. Por fim, os alunos com 1 no 3.º período estão fatalmente reprovados à disciplina, com ou sem exame. Finalmente, em 2006, mesmo com exames a valerem 3o% da nota final, só se um aluno tiver 3 no 3.º período e 1 no exame é que reprova à disciplina (em 2005 aconteceu a cerca de 15% desses alunos).
Conclusão: os exames do 9.º ano de 2005 a valerem 25% não terão causado uma única reprovação adicional em relação a 2004. E se, como refere a notícia, a taxa de retenção e desistência do 3.º ciclo em 2004/05, de 19,3%, foi a mais alta desde há nove anos, mesmo assim apenas dois pontos percentuais acima da taxa em 2003/04 e um ponto percentual acima da média dos nove anos (em 2001 e 2002 a taxa esteve acima dos 19%), não foi devido aos exames.
Parece então que estamos mais uma vez perante um problema de informação, com a agravante de se notarem, da parte de vários intervenientes, interpretações menos correctas e erros de aritmética elementar, que a serem cometidos por um aluno o levariam a reprovar.
O Público tem disponível na secção de Economia da sua edição online um inquérito bastante curioso. Perguntam-nos eles se achamos que o euro forte penaliza o custo de vida das famílias. HÃ?! Desculpem lá, não entendi.
Todos sabemos que o Euro tem valorizado progressivamente em relação ao dólar nos últimos tempos. Lembram-se há uns tempos de se falar em "paridade", conceito que na altura serviu, um pouco abusivamente na minha opinião, para dizer que um dólar se transaccionava nos mercados de câmbio ao preço de um euro? Pois bem, há cerca de um ano um euro já andava pelos 1.25 dólares e hoje, segundo o Banco de Portugal, já comprava 1.42 dólares. Ora, quem consome bens importados dos Estados Unidos (ou doutro país, se os preços estiverem denominados em dólares) sabe perfeitamente que paga menos euros por eles.
Claro, quem sai mal desta história são os exportadores que, vendo os preços dos seus produtos aumentados em dólares por via apenas da taxa de câmbio, têm mais dificuldades em colocá-los no mercado americano. Mas isto nada tem a ver com a pergunta, que se refere explicitamente às famílias e ao seu custo de vida.
Estará o Público a confundir "euro forte" com inflação na área euro? Talvez. Ou estarão eles completamente conscientes da pergunta e querem apenas induzir os leitores em erro. Parece que sim... à hora que escrevo, 510 pessoas (63% do total) já tinham dito que sim!
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