Sexta-feira, 16 de Novembro de 2007
A "economia 'parou' no último trimestre", segundo o Record. O que vamos comer este mês?, é a pergunta que se impõe. Não satisfeitos com as baboseiras que escrevem sobre a sua especialidade, os jornalistas do Record aventuram-se em terrenos estranhos e brindam-nos com pérolas destas.
1. Por favor, parem com essa história de afirmar que alguma coisa parou só porque não cresceu. E, não, as aspas no "parou" não servem como desculpa. Felizmente, ainda produzimos qualquer coisa. Parece que é pouco e é o mesmo do trimestre anterior, mas é alguma coisa.
2. Como já foi escrito aqui em baixo, a comparação do PIB entre trimestres não faz muito sentido. Isto porque existe uma coisa chamada "sazonalidade". É por demais sabido que diversos factores (tanto do lado da procura como do lado da oferta) fazem com que o ritmo de crescimento seja maior no primeiro trimestre do ano. A partir daí é sempre a descer. Diz-se por aí também que, ainda assim, a economia cresceu em termos homólogos, certo? Pois, é por expurgar estes efeitos da sazonalidade que esta medida faz mais sentido.
A quantidade de notícias que evito ler apesar de o título me parecer interessante, não tem fim. Quem lê jornais regularmente cria um sistema de pré-selecção muito rigorosa para não perder tempo com notícias de desavenças entre as secretárias de uma junta de freguesia com títulos bombásticos a embelezá-las.
Hoje no entanto caí em mais uma. Diz o DD que a
China bloqueia envio de correio para Portugal. Não contem com uma troca azeda de palavras entre os chefes de estado e uma guerra diplomática, pois não se trata de nenhuma retaliação de Pequim contra uma posição da Presidência da UE. O que aconteceu foi um mal-entendido sobre a duração da greve dos serviços postais portugueses.
Hoje na banca dos jornais onde costumo comprar o meu jornal diário, o meu olhar é atraído para o título do DN:
40 mil entraram na função pública.
Quem ler apenas este título, e uma em cada 5 pessoas lê apenas os títulos, fica com a ideia de que a nossa administração pública está a crescer.
Como faço os possíveis por estar informado, desconfio do número, pelo que resolvo ir à net ler a edição digital. Então leio informação mais completa: “Entre Janeiro de 2006 e Junho de 2007 entraram na administração pública 39 688 novos trabalhadores. Simultaneamente, saíram 54 460, dos quais 28 915 foram para a reforma”.
Feitas as contas, o saldo é negativo: no periodo referido, o efectivo total foi reduzido em 14.772 funcionários. É pouco? Está longe dos objectivos traçados pelo Governo? Claro. Mas o título é enganador pois transforma uma evolução positiva - embora de forma modesta - numa evolução negativa. E para quem lê apenas os títulos, aqueles que não fazem nenhum esforço para aprofundar o seu conhecimento do mundo, aqueles que votam com base nas suas convicções formadas por percepções rápidas e distorcidas da realidade, a informação que recebem é mentirosa! O sensacionalismo que distorce a realidade, por menor que seja, afecta a qualidade da democracia.
Quinta-feira, 15 de Novembro de 2007
Num
artigo da Lusa (retocado pelo DD?) sobre pagamento de parquímetros por telemóvel, o autor quis mostrar, num comentário lateral ao tema do texto, que até sabia umas coisas sobre telemóveis (relembro, o tema era os parquímetros). Escreveu então "
o serviço de pagamento via telemóvel já existe em algumas cidades da Europa, com enfoque nos países nórdicos, sendo a Suécia uma dos pioneiros neste tipo de pagamento, o país do fabricante de telemóveis NOKIA".
A Nokia é finlandesa.
Um cómico e triste exemplo de mau profissionalismo. A não perder no
Arrastão.
Os Factos
A nota atribuída pelos eleitores a Luís Filipe Menezes segundo a
sondagem CM Aximage foi de 9,7 em Outubro e 9,8 em Novembro.
Marques Mendes tinha tido 6,6 em Setembro.
Paulo Portas teve 6,5, 6,7 e 7,2.
Jerónimo e Louça têm 10,9 e 9,9 respectivamente.
Número de inquiridos: 501
Intenção de voto bruta no PS subiu de 34,8% para 36,1%.
As NotíciasNo CM, texto de Cristina Rita, temos no título "...
Menezes Popular". Popular com nota negativa, e com nota inferior a Jerónimo de Sousa e Francisco Louça, que não são referidos??
No CM a notícia diz "
Pelo segundo mês consecutivo, a popularidade do líder do PSD continua a subir". Segundo mês consecutivo? Então o homem está lá há um mês? (Eu sei que o texto é vago, e pode argumentar-se que "o
líder do PSD" pode referir-se também a Marques Mendes, mas não será certamente essa a interpretação mais comum). De qualquer modo com uma amostra tão pequena uma diferença de 0,1 em 20, além de ser um grão de areia, não é certamente estatisticamente significativa. Não se pode rejeitar sequer a hipótese de a popularidade ter descido. Qualquer pessoa séria diria pelo menos que a popularidade se manteve constante.
Título do DD: "
Sondagem: Luís Filipe Menezes é cada vez mais popular". Cada vez mais?? Mais à frente: "
A popularidade de Luís Filipe Menezes, continua a subir". Continua? Mesmos comentários que acima.
Se há alguma popularidade que se pode analisar é a de Paulo Portas que parece estar a subir, todas as outras são (julgo eu) estatisticamente constantes. Mas nenhuma das notícias se lembra de referir Paulo Portas.
Diz o CM "
isto apesar de as expectativas na actuação do Governo serem negativas: 50,1% dos inquiridos acham que o Executivo está a governar pior" e o DD "mas as expectativas na actuação do Governo são negativas, já que 50,1% (...) acha que o Executivo está a governar pior". Estes 50,1% caem literalmente do céu, já que não há nada no quadros dos resultados que aponte para eles. A palavra "pior" também é curiosa, porque não significa nada. Pior em relação a quê e em relação a quando? O único dado relacionado é a intenção de voto bruta no PS que... subiu!
Por último, um preciosismo sobre preciosismos. Os jornalistas adoram referir números porque dá um tom intelectual, sério e factual ao que escrevem, mesmo quando não fazem a mínima ideia do que significam. Um exemplo são os valores com várias casas decimais, como 5,812% quando a margem de erro é enorme. Ambas as notícias dizem que 43,8% do eleitorado do PP prefere Menezes a Sócrates, mas o número de pessoas inquiridas foram menos de 20!! Se em vez de ter sido a Maria (que prefere o Sócrates) a atender o telefone, tivesse sido o João (que gosta mais do Menezes) este número explodiria para 49% ou algo parecido, o que mostram bem a solidez deste
quarenta e três vírgula oito por cento.
Quarta-feira, 14 de Novembro de 2007
Parece que houve duas cartas enviadas à presidência da CML com denúncias relacionadas com as suspeitas que levaram à rusga da PJ na SRU Oriental de Lisboa. A primeira foi enviada quando Carmona Rodrigues ainda estava em funções, o que para a jornalista da SIC responsável pela reportagem transmitida esta noite, era prova cabal de que o então presidente estava a par da situação. Carmona negou, a jornalista insistiu e deu o dado como adquirido.
Só me vem à cabeça os "populares" que dizem que o Presidente da República e o Primeiro-Ministro sabem que que eles têm um sobrinho desempregado, só porque já lhe escreveram uma carta a contar a situação.
É o grande destaque do momento no
Diário Digital. Mais uma vez basta ler 2 parágrafos para perceber que isto é mais uma deturpação sensacionalista da realidade. O que o Diário Digital faz é comparar o PIB do 3º trimestre com o do 2º trimestre. Ora não se pode comparar o incomparável. Não posso dizer numa terça-feira que no dia anterior o PIB cresceu 200%, porque é óbvio que numa segunda se produz mais que num domingo.
As comparações devem ser sempre feitas em termos homólogos, comparando o 3º trimestre de 2007 com o 3º trimestre de 2006. Mas bolas, aqui houve um crescimento de 1,8% o que não dá tanta "pica".
Terça-feira, 13 de Novembro de 2007
O sensacionalismo jonalistico assenta muitas vezes na utilização de desavergonhadas "sinédoques". (Recordo que uma Sinédoque é uma figura de estilo que consiste em tomar a parte pelo todo). Podia chamar generalizações abusivas, mas sejamos simpáticos...
É que, se há casos, em que é perfeitamente justificado chamar a atenção para questões pontuais negativas, mesmo que isoladas, há outros casos, em que a descontextualização visa apenas o sensacionalismo, ou mesmo a manipulação.
Exemplo daquilo que é aceitável: se há 99,9% de professores cuja baixa médica foi justamente concedida, a notícia refere sempre os 0,1% que foram injustamente tratados. Sempre defendi que "zero erros" é uma meta sempre desejável, e que não nos devemos conformar com algo diferente.
Exemplo daquilo que não é aceitável, a “sinedoque utilizada pelo “Correio da Manhã” de hoje. Enquanto que na última página do Publico, na rubrica “Sobe e Desce” se faz um elogio a Jaime Gama: “Em tempos de austeridade é bom saber que há orgãos de soberania preocupados em dar o exemplo: Foi o que fez a Assembleia da República que elaborou um orçamento para o próximo ano que prevê um corte de 17 milhões de euros em relação aos gastos de 2007” o título da primeira página do “Correio da Manhã” é:
“3,4 milhões em viagens: deputados gastam mais 15,4%.
Claro que a notícia é verdadeira - os valores coincidem com os do Público - mas o foco não é posto na redução da verba global, mas no aumento de uma das parcelas.
Pensando melhor, isto não é uma sinedoque, é mas é falta de estilo.
Sábado, 10 de Novembro de 2007
Na contra-capa de hoje, o Sol brinda-nos com um título que afirma "Desemprego sobe",
Será que há novos dados do INE ou do IEFP que indicam uma subida de emprego? A notícia não diz.
Será que a notícias refere dados de outras fontes? Aparentemente não.
O que aconteceu foi que as previsões da Comissão Europeia relativamente ao desemprego português foram revistas em alta.
Não contente por confundir realidade com previsões, a notícia nem sequer compara os actuais números com a as novas previsões da CE. É que os últimos dados actuais do Eurostat até são mais altos que a nova previsão!