Não posso deixar de notar a quantidade de vezes que eu escrevo posts sobre a principal notícia do dia nos jornais. Neste caso escrevo apenas sobre o título da primeira notícia da primeira página, uma migalha no jornal. Porque o faço é óbvio: é a notícia que mais chama a atenção, logo aquela que leio com mais cuidado, logo aquela onde mais vez apanho erros. Uma pergunta impõe-se então: será que a "qualidade" vai melhorando lá para dentro?
Hoje em letras gordas na capa do Público: "
Há cada vez mais divorciados e viúvos a casar-se pela segunda vez em Portugal". Para sustentar tal tese é apenas referido que "
A percentagem de casamentos em que pelo menos um dos envolvidos já tinha sido casado anteriormente duplicou entre 1990 e 2006 - de 10,5 por cento passou para 20,6 por cento (uma em cada cinco) do total de uniões celebradas". Versão online
aqui.
1. Este dado
não sustenta a afirmação em letras gordas na primeira página porque o número total de uniões celebradas caiu fortemente nesse período, logo um aumento de 10% para 20% do total nem sequer implica que o número absoluto desse tipo de casamentos tenha aumentado. (Por acaso o número total não caiu assim tanto, mas Bárbara Simões não o verifica).
2.
Mesmo com um número absoluto deste tipo de casamento a aumentar, este dado
não sustenta a afirmação em letras gordas na primeira página, porque número de casamentos não implica número de pessoas casadas. Em 1990 se todos os já-anteriormente-casados casassem com outros já-anteriormente-casados mas em 2006 todos o já-anteriormente-casados casassem com solteiros, teríamos uma duplicação deste tipo de casamentos mesmo para o
mesmo número de já-anteriormente casados.
3.
Mesmo com um número absoluto deste tipo de casamento a aumentar, e
mesmo com a composição do casal a ser constante nos casamentos, este dado pode ser irrelevante porque o número de divorciados e viúvos pode estar a aumentar (o primeiro está de certeza, não verifiquei o segundo). Assim se o número de divorciados duplica e o número de divorciados a casar duplica também, não estamos aqui perante uma alteração em termos de comportamento de recasamento!
4. Não me dei ao trabalho de fazer o trabalho que a Bárbara Simões deveria ter feito, apenas li a conclusão do referido estudo publicado pelo INE, onde se afirma que "as taxas de recasamento de viúvos e divorciados tendem a diminuir tanto em Portugal...". Bolas!
Exactamente o contrário do que dá a entender o título.
Estes erros são irrelevantes? Claro que são! Estamos a falar de recasamento de divorciados! Agora se pensarmos que o mesmo tipo de erros acontece em temas bem mais "quentes"...