"Listas de espera em Portugal são 10 vezes maiores que em Espanha" diz em letras garrafais a capa do Público de hoje.
1. Usando os números apresentados na capa (e a estranha medida de tamanho das listas) as listas em Portugal são na realidade 8,24 vezes maiores, mas 10 fica melhor. Vinte ficaria melhor ainda.
2. Tal como diz a notícia os números não são de Espanha mas apenas da região de Madrid (que não é certamente igual ao resto da Espanha)! Isto escolhendo cuidadosamente os distritos a comparar poderíamos talvez chegar à conclusão que as listas em Portugal são mil vezes maiores ou até mil vezes menores.
3. A medida do tamanho da lista que o Público inventou é engraçada. Compara o número de pessoas, em cada mil, que esperam por uma cirurgia. Ora não faz sentido fazer rácios de percentagens (ou permilagens como aqui). Dizer que a área de Espanha é cinco vezes maior que a de Portugal faz sentido, agora o quíntuplo de uma percentagem pode nem sequer existir! Por exemplo se em Espanha 12% das pessoas esperasse por uma cirurgia, seria impossível Portugal ter uma percentagem 10 vezes maior (120% não existe).
4. Não é claro no artigo como foi calculado o número de pessoas à espera. Pegar no número de atrasos e dividir pela população seria um enorme erro porque há muita gente que está inscrita para a mesma cirurgia em vários hospitais ao mesmo tempo. Assim uma pessoa contaria por 3 ou 4.
5. Contar um número por cada mil não é uma percentagem (como diz o texto) mas uma permilagem.
6. É dito ainda que o tempo de espera é 100 vezes maior em Portugal. Isto faz sentido quando se compara as médias (ou talvez as medianas) mas o Público faz algo disparatado. Compara as percentagens de pacientes que espera há mais de 6 meses.
6.1. Mais uma vez o absurdo rácio entre percentagens.
6.2. Embora difícil, poderia acontecer até que a média de espera fosse menor em Portugal!
6.3. Comparar casos extremos não faz sentido. Imagine-se que em vez de 6 meses usaríamos 3 anos, e que nenhum paciente em Espanha esperasse mais de 3 anos. A brilhante conclusão que o Público tiraria seria que o tempo de espera em Portugal é infinitamente maior do que em Espanha.
Moral da história: usando esta falta de rigor na análise dos dados, poderiamos chegar ao resultado que nos apetecesse.