Sobre a notícia da Agência Lusa publicada hoje no Público com o título “Chumbos no básico e secundário atingiram este ano o valor mais baixo da última década”:
1. Tudo corria bem com a distinção entre taxas e pontos percentuais, até que lá apareceu a habitual confusão, ao referir-se que no 9º ano se registou a maior queda na taxa de chumbos -- uma queda de 7,5%. O que o(a) jornalista queria dizer era uma queda de 7,5 pontos percentuais.
2. A notícia não indica se os dados se referem apenas a Portugal continental ou se inclui as ilhas. Apenas após uma pesquisa pela informação disponível no website oficial do Gabinete de Estatística e Planeamento da Educação (GEPE) do Ministério da Educação se conclui que estes se referem, provavelmente, ao continente e ilhas. Isto porque, a referirem-se apenas ao continente, as variações, em pontos percentuais, descritas no texto estão todas erradas.
3. No texto, lê-se apenas sobre a taxa de chumbos. Ora, uma diminuição da taxa de chumbos de um ano para o outro não implica necessariamente uma diminuição do número de chumbos, mas apenas uma diminuição do número de chumbos em relação ao número de inscritos.
a. Se o número de chumbos se mantiver constante e o número de inscritos aumentar, a taxa de chumbos diminui. Mais, a taxa de chumbos pode até diminuir com o número de chumbos a aumentar, bastando que um aumento do número de inscritos seja superior a um aumento do número de chumbos.
b. De facto, extraindo informação do website do GEPE é possível verificar, por exemplo, que em Portugal (continente e ilhas) o número de inscritos no total do Secundário aumentou no ano lectivo 2006/07. Curiosamente, ainda não existe qualquer informação relativa ao número de inscritos no ano lectivo 2007/08, um ano após o início do mesmo.
c. No entanto, no Portal do Governo é possível encontrar uma nota do Ministério da Educação que refere que “neste ano lectivo [2007/08] estão matriculados no ensino secundário 282 188 jovens, mais dois por cento que no lectivo anterior [2006/07]”.
4. Mas então fica a questão: como se explica a discrepância dos valores, especialmente quando é possível calculá-los de diferentes formas? É que aquele número no Portal do Governo não bate certo, em diversos milhares, com nenhum dos números do relatório que é possível retirar do site do GEPE. Isto é importante porque tem efeitos no cálculo da taxa de chumbos (ou de qualquer outra taxa).
5. Relativamente à polémica sobre os exames do 9º ano deste ano e à referência, na notícia em causa, ao Ministério da Educação e à Ministra (“Em Março deste ano, o ME divulgou os números relativos ao ano lectivo anterior, que também já representavam uma evolução positiva. Na altura, a ministra Maria de Lurdes Rodrigues considerou "notável" a diminuição deste indicador, atribuindo-a a medidas como o plano de acção para a Matemática e o Plano Nacional de Leitura”):
a. A classificação de um aluno no 9º ano é feita de 1 a 5, em que se arredonda qualquer classificação final para a unidade mais próxima. Os exames, esses, valem 30%. Ou seja, um aluno que tenha 3 no final do 3º período, só reprova se obtiver 1 como classificação no exame e um aluno com 2 no final do 3º período, transita se obtiver um 4 no exame.
b. Segundo noticiava o Público em Julho último, “a percentagem de notas de nível 5 (a mais alta) subiu de 1,4 por cento para 8,3 por cento. As classificações equivalentes a Bom (nível 4) dispararam de oito por cento para 21,4. (...) A classificação mais baixa de todas (nível 1), por exemplo, foi atribuída a apenas 3,3 por cento. Em 2007, foram 25 por cento a ter esta nota.”
c. Comparar taxas, sejam elas de reprovação ou de outra coisa qualquer, só faz sentido se for possível comparar níveis de dificuldade das provas. E a melhor forma de averiguar a dificuldade das provas é, provavelmente, perguntando aos alunos, ou pedindo-lhes que realizem uma prova de um ano anterior. Nem precisa de ser a todos, basta uma amostra representativa. A este respeito ver, por exemplo, este artigo no Daily News.