"No terceiro trimestre tivémos [sic Público] um crescimento negativo. É possível que no quarto trimestre [Portugal] também tenha um crescimento negativo" disse ontem Vítor Constâncio. Ou seja, há a possibilidade de as coisas ficarem na mesma (ou piorarem) em termos de crescimento. É impressionante como os pasquins gratuitos foram capazes de deturpar esta frase.
Recessão bate à porta, diz o Global em grande na capa.
Recessão à vista para Portugal, "informa" o Metro.
Recessão vai chegar no fim do ano, diz o Destak também em grande.
O Metro, apesar de ter o título menos aldrabado, consegue compensar a coisa com um subtítulo vergonhosamente enganador: Os dados económicos divulgados pelo INE indicam que não iremos escapar à tendência global.
O Público também fabricou uma notícia à volta desta frase de Constâncio. Depois de uma primeira notícia, onde se dizia que Vitor Constâncio tinha sublinhado que não havia "recessão técnica" (o que é óbvio e indiscutível), quando apareceu aquela frase, tivemos o Público a afirmar Vítor Constâncio admite, afinal, recessão técnica no final deste mês, insinuando que havia um recuo ou contradição, quando na realidade estavam em causa apenas duas coisas perfeitamente simples e compatíveis. Primeiro, houve um trimestre de crescimento negativo, e segundo, pode vir aí outro.
Por último, o incansável Rudolfo Rebêlo escreve no DN que Portugal já vive em recessão técnica, após o INE divulgar a quebra da economia no terceiro trimestre. Para este ano, o Banco de Portugal prevê um crescimento de 0,5% da economia, o que implica para o quarto trimestre um recuo de 0,3% em relação aos meses de Julho a Setembro. Ou seja, mistura-se dados reais com previsões, mistura-se dados de fontes diferentes, pega-se num 0,5% e sabe-se lá mais o quê para chegar a 0,3%...
Porque é que temos a sensação de que quanto pior... melhor?
Porque é que os jornais e jornalistas andam a prestar esse tipo de serviços?
A quem interessará este tipo de notícias?
De Anónimo a 11 de Dezembro de 2008 às 09:51
Na página principal do jornal de negócios de hoje temos o fenómeno dos preços negativos. Mais uma vez não há noção de nada.
"09:16 Christian Noyer , membro do Conselho de Governadores do Banco Central Europeu BCE ), admitiu, em entrevista concedida ao Le Figaro ", que as expectativas para a inflação caíram e que os PREÇOS no consumidor podem mesmo vir a ser NEGATIVOS, em alguns meses, em 2009."
Impressionante.
É mais uma vez a eterna confusão dos nossos jornalistas, entre um valor e a sua variação. Entre o preço e a inflação. Entre a riqueza e o crescimento dela. Entre a posição e a velocidade...
De Zé Manel a 11 de Dezembro de 2008 às 10:48
Curioso é que fiz um comentário ao Público última hora na internet reafirmando a falta de rigor nos títulos das notícias, resultado? O comentário não foi publicado (não tendo sido caso único). Comentando o comentário, estas notícias só interessam aos abutres...
Cumprimentos.
Isso é grave, muito grave.
Infelizmente, já me sucedeu o mesmo noutros jornais. E garanto que não foi por linguagem rude ou falta de respeito. Limitei-me a chamar a atenção para incongruências na notícia.. e os comentários não foram aprovados.
De Sérgio a 15 de Dezembro de 2008 às 13:48
"Impressionante. É mais uma vez a eterna confusão dos nossos jornalistas, entre um valor e a sua variação"
O que para mim é impressionante é a forma como vocês fazem, constantemente e com todo o à vontade, generalizações sobre toda uma classe profissional... Parece precisamente o contrário daquilo que vocês aconselham (e bem) aos jornais quando estes generalizam os resultados de um inquérito, por exemplo. Acho que deviam ter mais cuidado e rigor neste pormenor quando fazem os vossos posts. Com isso e com a forma como "adivinham" as intenções dos jornalistas quando estes escrevem os seus textos. Qualquer erro ou imprecisão é logo visto como uma tentativa de aldrabar os leitores para vender mais jornais. Acho que para tirarem essa conclusão é melhor verificarem se existe um comportamento repetido desse género por parte do jornalista (o que efectivamente sucede em alguns casos).
Ou têm mais cuidado com estas questões, ou então estão mesmo convencidos que um jornalista, por princípio, é ignorante e desonesto e nesse caso não há mesmo nada a fazer.
Caro Sérgio,
tenho que lhe dar em parte razão. Não gosto de generalizações, e lamento que a minha frase tenha soado a generalização. Mas parece-me que você leu ali uma generalização abrangendo toda uma classe, que não existe. Apenas quis dizer que este blog está cheio (apinhado mesmo) daquele erro específico. Em lado nenhum disse, nem dei a entender, que todos os jornalistas o faziam.
Aliás, repare que se referiu a um comentário e não a um post (onde obviamente as regras "editoriais" e de bom-senso serão diferentes). Se realmente fazemos assim tantas generalizações (e de ânimo leve), porque não se referiu a um post?
Quanto a "adivinhar" as intenções, mais uma vez não sei se sei a que se refere. Neste post concreto é óbvio para todos, que as deturpações em causa nas capas são sensacionalistas (para lá de enganadores). Se são propositadas ou não, não sei, nem a isso me referi.
Já agora, sem qualquer segunda intenção, porque diz "ignorante e desonesto"? Não nos estava exactamente a pedir a distinção entre as duas coisas?
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