Segunda-feira, 10 de Março de 2008
Acaba de sair uma nota do INE sobre o comércio externo português. De 2006 para 2007 as exportações para a UE subiram mais que as importações, as exportações extra-comunitárias também subiram mais que as importações, e por conseguinte a taxa de cobertura (percentagem do que compramos que é "compensado" por vendas nossas, ou seja exportações/importações*100) também subiu.
Tudo boas notícias, mas o que é o Diário Digital escreve?
Título: Défice comercial português agravou-se 4,12% em 2007
Parágrafo em destaque:O défice comercial português ascendeu a 19.356,2 milhões de euros no ano passado, um agravamento de 4,12% face a 2006, informa esta segunda-feira o Instituto Nacional de Estatística (INE).
A informação está correcta, é possível a taxa de cobertura melhorar e o saldo piorar, mas quando isso acontece devemos dar atenção à primeira, não ao segundo. Isto por uma razão muito simples, a variação da primeira diz-nos se estamos numa trajectória sustentável (se caminhamos para a bancarrota ou não), mas a segunda não dá informação nenhuma.
E não se julgue que sou apenas eu. Nem se julgue que o jornalista fez copy-paste sem pensar mais no assunto. O próprio comunicado da INE destaca a variação da taxa de cobertura na primeira página, e nunca refere a variação do saldo ao longo de oito páginas! Foi o próprio jornalista que depois de ler o texto do INE, se deu ao trabalho de ir caçar um mau resultado aos quadros e foi calcular aqueles 4,12%.
Dito de outro modo, se aqueles 4,12% são tão significativos como o jornalista nos quer fazer crer, porque é que eles nem constam do comunicado de oito páginas?
Quinta-feira, 6 de Março de 2008
O jornalismo é suposto ser constituido por textos informativos e objectivos, não deve ser por isso ser confundido com poesia. Os jornalistas adoram contudo arranjar palavras diferentes, como o "abrandar", que já várias vezes referi, e que se pode prestar a várias interpretações. Se calhar até dá jeito... No Diário Digital tínhamos há pouco
Meio da sessão: PSI-20 acelera 0,9%
Acelera 0,9%?
E isso quer dizer o quê?
Segunda-feira, 3 de Março de 2008
Para lá do erro habitual das percentagens (quando o PS desce de 38,1% para 36,1%
não desce 2% como diz o jornalista, desce sim 5% ou dois pontos percentuais) o
Diário Digital traz uma palermice nova sobre sondagens:
"
A subir estão também as intenções de voto no Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva". Ena, há eleições presidenciais e eu nem sabia. Aparentemente o Cavaco tem 62% de intenções de voto.
"
José Sócrates [regista] nova quebra (...) nas intenções de voto, surgindo, em Fevereiro, com 29,8%"
"
Tendência idêntica apresenta Luis Filipe Menezes, líder do PSD (...) apresentando agora 21,9% de intenções de voto"
Olha, o Sócrates e o Menezes também são candidatos! Que raio, não sabia de nada... Mas espera, as percentagens somadas dão mais de 100%! Será que o jornalista nem sabe distinguir intenções de voto da percentagem da população com uma avaliação positiva dos políticos?
Terça-feira, 26 de Fevereiro de 2008
Mais um exemplo do eterno erro de comparar valores de estatísticas com flutuações enormes:
Brasil: IDE português triplica em Janeiro diz o Diário Digital. O investimento directo estrangeiro,
mesmo em termos anuais, tem enormes flutuações, logo é preciso ter algum cuidado em comparar uma período com o outro. Aqui a situação ainda é pior porque apenas se compara uma fracção do IDE total (aquele dirigido ao Brasil) dentro de outra fracção do IDE (aquele de Janeiro).
Como sempre, um exemplo semelhante e mais infantil para o jornalista responsável pela peça, é como afirmar que
Chuva aumenta 10000000% porque ontem caiu uma gota e hoje choveu, ou seja uma informação irrelevante.
Quarta-feira, 20 de Fevereiro de 2008
Sexta-feira, 15 de Fevereiro de 2008
Segundo fontes muito duvidosas era este o título que o Diário Digital queria usar para a notícia sobre a reformulação do ensino para deficientes. Alguém mais conservador lá achou que seria demais, e o título escolhido acabou por ser apenas
Governo retira ensino especial a deficientes.
A notícia é baseada noutra do DN cujo título é
Governo tira deficientes do ensino especial. Reparem só na subtil diferença semântica. Afinal não é o ensino que é retirado aos deficientes, mas o contrário.. e isto faz toda a diferença.
No texto do DN diz-se no início que o governo obriga os pais de alguns deficientes (entretanto já não são todos, como transparece do título) a pagar do seu bolso o ensino especial.
Lá mais para o meio do texto percebe-se que a ideia não é retirar direitos e cobrar dinheiro, mas
encaminhar alguns tipos de deficientes para uma integração no ensino normal:
A ideia central do novo diploma é fomentar a integração das crianças com certas deficiências nas escolas do ensino regular, onde poderão receber pontualmente apoio educativo especial, assegurado por professores com formação específica.
Como sempre não estou a querer defender uma ou outra política, apenas a notar como os títulos sensacionalistas induzem os leitores em erro. Um exemplo muito semelhante também associado a direitos de deficientes, é a alteração ao IRS. A alteração foi neutra em termos de impostos recolhidos, apenas houve uma reafectação nos diferentes escalões de rendimentos, mas a grande maioria das pessoas ainda está convencida que o governo pôs os deficientes a pagar mais impostos.
Quinta-feira, 14 de Fevereiro de 2008
No
DD:
A primeira estimativa para o Produto Interno Bruto da Zona Euro (medido em volume) aponta para um aumento anualizado de 0,4% (+0,8% no terceiro trimestre), enquanto Portugal registou variação de 0,7% (-0,1%).
Na
fonte da notícia, logo na primeira frase:
GDP grew by 0.4% in the euro area (EA13) (...) during the fourth quarter of 2007,
compared with the previous quarter.Ou seja é crescimento trimestral não-anualizado.
Um erro menor, mas mais um exemplo de jornalismo às três pancadas.
P.S. Só me chamou a atenção, porque um crescimento de 0,4% a ser anualizado, seria uma péssima notícia para a economia europeia. Em comparação com o mesmo trimestre do ano passado, o crescimento foi de 2,4%.
Segunda-feira, 11 de Fevereiro de 2008
Só nas 5 notícias principais do Diário Digital a esta hora temos mais dois exemplos:
Salas de cinema perderam 134 espectadores/dia em 2007 As salas de cinema portuguesas foram visitadas por 16.318.378 espectadores no ano passado, o que traduz uma quebra de 0,3%Uma variação de 0,3% é estatisticamente insignificante. Basta ter havido mais noites de sexta-feira com chuva para haver uma variaçãozeca destas, o que não significa que haja menos gente a querer ir ao cinema.
Volume de negócio nos serviços abrandou em DezembroO volume de negócios no sector dos serviços registou uma taxa de variação homóloga de 5,1% em Dezembro de 2007, abrandando 0,4 p.p. relativamente a NovembroO exemplo clássico da vontade de dar más notícias. Claro que "abrandar" pode ter duas interpretações: estar pior ou até estar melhor mas com uma melhoria mais lenta. Mas por favor, estamos a falar de um crescimento de 5,1%, e mesmo assim a notícia consegue ser pintada de preto.
Colocando a questão de outra maneira: haveria algum jornalista que perante o facto do volume de negócio ter
diminuído "apenas" 5,1% em vez de 5,5%, ou seja tendo
decrescido o volume de negócios, diria que o volume de negócios está a aumentar ou acelerar??
Terça-feira, 22 de Janeiro de 2008
O Diário Digital escreve hoje
"Estudo: Portugueses têm das pensões mais baixas da Europa", referindo-se a um Estudo da
AXA. Ora basta abrir a página da AXA para ver que o estudo não tem uma amostra exaustiva nem representativa da Europa. Ou basta ler a frase "
Portugal é o país europeu com as pensões mais baixas, a seguir à Hungria e à República Checa" da notícia para concluir que falta ali muita coisa.
Um exemplo: usando como amostra Portugal, Bielorrússia, Estónia, Moldávia, Roménia, Sérvia, Bósnia, Croácia, Bulgária, etc... o DD iria concluir em grande estilo algo como "Portugal tem pensões
três vezes maiores que a média europeia".
Se a amostra for Portugal, Suiça, Suécia, Irlanda, Noruega, Holanda, Luxemburgo, etc... a conclusão teria que ser "Portugal tem pensões a
metade da média europeia".
Ora até um miúdo de 10 anos sabe que ambas não podem estar correctas ao mesmo tempo, ou parafraseando o imaginário moço, "
os senhores do Diário Digital são uns aldrabões".
Sexta-feira, 21 de Dezembro de 2007
No título: "Vagas para médico de família vão aumentar 5%, diz o ministro". No subtítulo: "...aumentarão dos actuais 25 para 30 por cento". Depois de ter visto José Sócrates dizer disparate semelhante, este não me espantaria. No entanto, acabei de ver a peça do Jornal da Tarde da RTP sobre o mesmo assunto e não ouvi do Ministro da Saúde a afirmação que lhe é atribuída no título. O disparate parece ser mesmo do(a) jornalista do Diário Digital.