Parágrafo principal de uma notícia no Público de Sábado: Os indicadores da instituição mostram que o consumo privado caiu (...).
No texto: O indicador coincidente relativo à evolução homóloga do consumo privado (..) mantendo-se, no entanto, ainda em terreno positivo.
A sede da desgraça corre nas veias de muita gente, e a Catarina Almeida Pereira do DN aí está para a alimentar. Assina hoje um artigo com o título Salários baixos estão cada vez mais baixos. Um título, três afirmações infundadas (de acordo com o próprio texto! nem verifiquei a fonte).
1. Salários baixos?
O estudo foca-se aparentemente em metade dos trabalhadores portugueses. Possivelmente os salários mais baixos nem foram incluídos no estudo.
O grupo ao qual a Catarina chama "salários baixos" tem 940 mil trabalhadores, uma imensa multidão. Obviamente que dentro desse grupo a evolução foi diferente de escalão para escalão. Será que os realmente mais baixos subiram ou desceram? Não se sabe.
Mas mesmo esse grupo é curioso. Será que o que define o grupo é o nível dos salários? Não! É o tipo de emprego.
2. Cada vez?
A Catarina compara dois anos. Talvez seja só eu, mas para mim em português "cada vez mais" significa que há uma repetição, um acumular. Comparando dois anos, apenas podemos saber se subiu ou desceu, não se continuou a subir a descer.
3. Mais baixos?
A Catarina apenas refere o salário em relação à média naquele ano, mas a média não é fixa. Entre 50% do salário médio norueguês ou 100% do salário médio etíope, eu diria que o primeiro é mais alto. Mas talvez seja só eu.
Na terça-feira, São José Almeida e Maria José Oliveira escrevem no Público, “Canção dos Xutos transformada em manifesto contra Sócrates”.
Eu fico impressionado com a quantidade de vezes em que se diz que 5 é maior do que 6 nos media portugueses. Ainda agora foi a TSF que repetiu até à exaustão que "2008 foi o ano mais violento da última década". A notícia até está online, para se confirmar.
Abre-se o relatório da segurança interna e quais são os números que se vêem?
Criminalidade Violenta:
2008: 24317
2006: 24534
2004: 24469
Estou em crer que o número de 2008 é mais baixo do que os outros dois, mas devo ser só eu.
Nota: eu estou a comparar os números pela bitola da TSF! Não faz sentido tirar grandes conclusões de números que tratam um homicídio e um roubo por esticão da mesma maneira. Além disso tratam-se de números dos crimes registados, e não de números dos crimes praticados como a TSF faz crer.
Adenda: julgo ter percebido de onde vem a aldrabice da TSF. Não fui verificar a veracidade dos números, mas comparando com um artigo no Expresso, parece-me que a TSF inclui coisas como passagem de moeda falsa, condução com álcool em excesso, falsificação de documentos, condução sem carta, incumprimento dos direitos de autor, etc. na sua definição de "violência". Porquê ficar por aqui? Uma má combinação de cores na roupa, um erro num exame de história, tudo isso pode ser violência. Basta querermos!
O Público, que ontem foi um dos exemplos da comunicação social que andou a anunciar que o Governo ia benemeritamente pagar as prestações da casa aos desempregados, diz hoje na manchete "Beneficiários da redução nas casas terão de reembolsar tudo a partir de 2011". Acrescenta depois na capa "não implica perdão dos restantes 50 por cento da prestação, mas o seu pagamento posterior (...) Está em causa um adiamento do valor da prestação". Ou seja trata-se de uma moratória, palavra dita pelo primeiro-ministro e que aparecia perdida no texto de ontem do Público (notícia essa que continua online sem correcções).
Repare-se que a manchete não diz "Governo anuncia moratório" ou "adiamento do pagamento da prestação". A manchete não está a dar a notícia essencial, está a complementar/corrigir uma notícia prévia... notícia falsa que o Público ajudou a criar.
O desvario não tem limites.
Anda meio mundo a dizer que o consumo anda a cair, os consumidores andam a retrair-se, etc. e os sacanas dos consumidores e o INE teimam em contrariar a notícia que esta gente queria dar.
Ainda hoje no Público Eduardo Melo afirma "O momento é de retracção do consumo privado" e "o facto é que a deterioração da actividade económica interna e internacional, decorrente da quebra do consumo...". Estas afirmações vinham a propósito do relatório do INE onde o indicador quantitativo do consumo privado (estimativa grosseira da variação do consumo) tem o valor +0,9. (Eduardo, o símbolo da cruz significa que é positivo). E não é só o último, todos os valores que estão no quadro são positivos, tal como a variação do consumo trimestral dos últimos 5 anos.
Chamada de atenção do leitor MCP
Destak de hoje:
Manchete: Violência nas estradas aumenta
Lead: (...) Segundo um especialista contactado pelo Destak, as frustrações profissionais e económicas estão a tornar os condutores mais agressivos.
Texto principal: [Trata-se de um texto com exemplos concretos de violência nas estradas. Diz apenas a certa altura:] (...) Se juntarmos à hora de ponta os nervos à flor da pele ou a crise financeira mundial, pode imaginar-se quais são as palavras evocadas pelos condutores (...).
Caixa: Apesar de não existirem dados estatísticos que mostrem que a violência nas estradas tem vindo a aumentar, a verdade é que este tipo de comportamentos «é mais frequente com o stress, o aumento de carros na estrada, o trânsito e a frustração profissional e económica, factores característicos do nosso tempo». (...) diz ao Destak o psicólogo Carlos Lopes Pires.
(sublinhados meus)
Comentário meu: não contente com fazer uma afirmação para a qual não apresenta uma única prova ou indício, a Patrícia Susano Ferreira foi ainda deturpar o que o psicólogo disse em vários aspectos. (Só por curiosidade o trânsito até tem diminuido nos últimos tempos)
Outro grande clássico, que também está implícito no post anterior. Aqui fica um exemplo, desta vez dedicado a João Ramos de Almeida, responsável pela notícia de destaque da capa do Público e onde se fala em "cortes de pensões", "quebra de pensões", "uma coisa é certa: as pensões desses portugueses vão diminuir em cada ano", para lá de outros disparates, pe onde só um leitor muito atento se apercebe que se fala de variações relativas e não absolutas:
O Rui ganha 10 maçãs* ao mês. Depois reforma-se e ganha 7 maçãs de pensão.
O Pedro ganha 20 maçãs, na reforma recebe 10 maçãs.
Se o Ricardo passar da reforma do Rui para a do Pedro, tem uma subida ou um corte na reforma? (O João acha que é um corte...)
*Falo em maçãs, para se perceber que isto não tem nada a ver com inflação.
Adenda: tal como no post anterior, tivemos uma jornalista a falar de desemprego baseando-se num relatório onde não aparece sequer a palavra desemprego, aqui temos uma manchete sobre o valor das pensões supostamente baseada num relatório, no qual não há uma única referência ao valor das pensões em Portugal.
Nota habitual: não estou a dizer que concordo ou deixo de concordar com o que quer que seja sobre a política económica, nem se é justo ou injusto o que acontece aos moços do meu exemplo. Digo apenas: aquela notícia induziu a grande maioria dos leitores em erro.
Aquando do último relatório do Eurostat sobre comércio, escrevi este post onde mostrava a dualidade de critérios do Público. Quando há uma má notícia publica-se, quando há exactamente a mesma (na realidade até era melhor naquele exemplo!) mas em versão positiva, omite-se.
Hoje saiu mais um relatório que é, por sorte minha, exactamente o oposto do último. Entre os países mencionados, Portugal teve o segundo melhor comportamento (segundo pior há um mês) e o melhor em absoluto na Zona Euro (pior absoluto há um mês).
O título e parágrafo inicial no Diário Digital há um mês:
As vendas no sector de retalho nacional caíram 6,9%, em Dezembro do ano passado, a segunda quebra mais forte no conjunto da União Europeia, indicam dados preliminares do Eurostat esta quarta-feira.
Hoje:
As vendas no sector de comércio a retalho cresceram 0,6%, em Janeiro, no conjunto da União Europeia (+0,1% na zona euro), face a Dezembro de 2008, revelou o Eurostat esta sexta-feira.
Na RTP online há um mês, havia o título :
Vendas a retalho caíram quase 7% em Dezembro- Eurostat
Hoje: Pevas
Público há um mês, tinha o título:
Vendas a retalho de Dezembro recuam em Portugal mas estabilizam na Zona Euro.
Hoje: Pevas
O título da RTP não dava ênfase à posição relativa de Portugal, apenas ao nível, mas o mesmo não se passava com o texto. Hoje o oposto não mereceu referência. O Público foi muito claro ao comparar Portugal com a Zona Euro, mas hoje que teria a novidade oposta não mereceu notícia. Mas o prémio vai para o Diário Digital. Em ambos os casos teve notícia, no primeiro insistiu na comparação, e hoje nem piou no destaque.
Criminalidade atinge a maior subida de sempre diz o título da Valentina Marcelino no DN. Mas logo na terceira frase ela desdiz "significa o maior crescimento dos últimos dez anos em Portugal".
E a coisa ainda ficar pior lá para o meio: "a maior, desde que há registo oficial destes dados, nos últimos dez anos". Repare-se que ela não diz "a maior desde que há registou, ou seja 10 anos" ou "a maior nos últimos, que é quando há registos". Se aquela frase for tomada literalmente, ela dá a entender que há subidas maiores registadas.
Já nem falo da confusão crime vs crime registado.
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