Quinta-feira, 26 de Março de 2009

Mas não sabem contar?

Eu fico impressionado com a quantidade de vezes em que se diz que 5 é maior do que 6 nos media portugueses. Ainda agora foi a TSF que repetiu até à exaustão que "2008 foi o ano mais violento da última década". A notícia até está online, para se confirmar.

Abre-se o relatório da segurança interna e quais são os números que se vêem?

Criminalidade Violenta:

2008: 24317

2006: 24534

2004: 24469

 

Estou em crer que o número de 2008 é mais baixo do que os outros dois, mas devo ser só eu.

 

Nota: eu estou a comparar os números pela bitola da TSF! Não faz  sentido tirar grandes conclusões de números que tratam um homicídio e um roubo por esticão da mesma maneira. Além disso tratam-se de números dos crimes registados, e não de números dos crimes praticados como a TSF faz crer.

 

Adenda: julgo ter percebido de onde vem a aldrabice da TSF. Não fui verificar  a veracidade dos números, mas comparando com um artigo no Expresso, parece-me que a TSF inclui coisas como passagem de moeda falsa, condução com álcool em excesso, falsificação de documentos, condução sem carta, incumprimento dos direitos de autor, etc. na sua definição de "violência". Porquê ficar por aqui? Uma má combinação de cores na roupa, um erro num exame de história, tudo isso pode ser violência. Basta querermos!

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publicado por Miguel Carvalho às 23:57
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Sexta-feira, 13 de Março de 2009

Será que não se sentem ridículos ao escrever estes títulos?

Criminalidade atinge a maior subida de sempre diz o título da Valentina Marcelino no DN. Mas logo na terceira frase ela desdiz "significa o maior crescimento dos últimos dez anos em Portugal".

E a coisa ainda ficar pior lá para o meio: "a maior, desde que há registo oficial destes dados, nos últimos dez anos". Repare-se que ela não diz "a maior desde que há registou, ou seja 10 anos" ou "a maior nos últimos, que é quando há registos". Se aquela frase for tomada literalmente, ela dá a entender que há subidas maiores registadas.

 

Já nem falo da confusão crime vs crime registado.

 

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publicado por Miguel Carvalho às 11:44
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Quarta-feira, 18 de Fevereiro de 2009

Se não aconteceu, podia ter acontecido

O jornal humorístico 24 Horas, concorrente fraquinho do Inimigo Público de onde roubei o título do post, diz hoje na capa: Portugal é o país da Europa com maior taxa de homicídio. Relatório da ONU preocupante. O mais grave não é,

 

- deixar a ideia na capa de que se tratam de números actuais

- nem generalizar os dados de um ano só, quando eles são muitos voláteis (em 2006, o ano escolhido pelo 24 Horas, a taxa foi de 2,15 mas tinha sido 1,66 no ano anterior e terá sido algo como 1,6 no ano seguinte pelo que percebo do texto do jornal),

- nem "esquecer" que países como França, Bélgica, Luxemburgo, Hungria, Bulgária, Islândia etc. (salvo o erro são países europeus), não constam do relatório,

- nem "esquecer" que as definições jurídicas de homicídio, e logo as estatísticas em si, não são comparáveis entre países*.

 

O mais grave é haver vários países europeus (Bielorrússia, Estónia, Letónia, Lituânia, Mónaco) onde a taxa de homicídio foi mesmo maior do que a nossa no ano escolhido pelo 24 Horas. E isto não os impediu de escolherem o título que escolheram.

 

Depois há o SOL que faz copy-paste do 24 Horas sem se dar ao trabalho de verificar os dados. O Público além de se esquecer no título da França, Bélgica e Luxemburgo, deve julgar que o Mónaco é um país nas Caraíbas.

 

*Normalmente não faria esta crítica, porque o jornalista não é obrigado a saber este pormenor.  Normalmente diria que a tarefa do jornalista é apenas usar os números da fontes. Mas neste caso, é o próprio corpo da notícia que diz que os números não são comparáveis.

publicado por Miguel Carvalho às 19:27
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Domingo, 21 de Setembro de 2008

Confusão Nível vs Variação nas estatísticas obscuras

Sempre que há uma queda nas estatísticas do crime, e há alguém que se felicita por tal facto, há sempre um chico-esperto que vem criticar tal felicitação, acusando-a de ser ingénua por os dados estatísticos oficiais não incluírem todos os crimes realmente cometidos.

Acho que ninguém nega o facto de haver muito mais crimes do aqueles que aparecem no dados, porque existe muita criminalidade que não é declarada à polícia. Mas esta falha afecta apenas o nível da criminalidade (se é 8 ou 80) e não a variação (se subiu ou desceu). A não existir nenhuma razão para que o nível de não-participação tenha variado de um ano para outro (e nunca vi ninguém a afirmar que isto acontece), a variação dos dados oficiais dão uma credível indicação da variação os valores reais. O chico-esperto é que é ingénuo.

 

Hoje no Expresso online Valentina Marcelino faz isto mesmo a propósito de incorrecta contabilização dos mortos nas estradas (apenas são contabilizados os que morrem no local do crime, deixando de fora os mortos no hospital). A propósito da congratulação por parte do MAI sobre a redução do número de mortos, a Valentina escreve "o Governo sabe que as vítimas mortais de acidentes rodoviários são muito mais [Nível] do que os números divulgados. Mesmo assim, o ministro da Administração Interna, Rui Pereira, e o presidente da ANSR, Rui Marques, estiveram lado a lado esta semana a anunciar resultados de sucesso em matéria de sinistralidade. Menos 44 mortos até 15 de Setembro que em igual período de 2007 [Variação]. Valores longe de serem os reais."

Ou existe alguma razão paranormal para ter havido mais mortos nos hospitais do que no ano passado (o que Valentina não refere), ou então esta redução de 44 indicia mesmo uma redução real do número total de mortos.

 

Adenda: pelo que percebo do resto notícia, houve até (por coincidência) um aumento do número de mortes nos hospitais. Mas não era claramente isto que levou a jornalista a escrever o parágrafo acima.

publicado por Miguel Carvalho às 15:28
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Quarta-feira, 5 de Março de 2008

Ontem nevou em Portugal mas não na Islândia, o que contraria a ideia de que a Islândia é mais fria

Como o Óscar antevia aqui, esta "onda de crimes" levou a uma "onda de disparates" por parte dos jornalistas, políticos e afins. A capa do DN de hoje referente a um texto de Ana Mafalda Inácio e Tiago Melo, apesar de tentar pôr alguma água na fervura, é disso um exemplo:
"Onda de homicídios contraria queda de 30% no ano passado"

1. É um absurdo chamar onda de homicídios a actos isolados e independentes, pura e simplesmente porque aconteceram todos em períodos curtos. Segundo a notícia nos últimos três anos o número de homicídios foi de 133,194 e 135, o que é baixo em termos europeus. Fazendo uma pequena simulação onde assumo que a criminalidade é constante ao longo dos anos, conclui-se que em 71% dos anos há períodos de pelo menos 5 dias consecutivos com homicídios, e em 36% dos anos períodos com pelo menos 6 dias consecutivos com homicídios. Ou seja estes picos são mais que banais, não fazendo sentido chamar-lhe "onda".

2. Sendo altamente prováveis, não contrariam absolutamente nada, como o título faz crer, porque não indicam de modo nenhum um aumento do nível de crime. Mais, é também altamente provável que um ano tenha mais dias com homicídios consecutivos do que outro ano, e mesmo assim ser mais seguro (ter muito menos homicídios ao fim do ano).

3. A queda de 30% nem sequer pode ser "contrariada" porque o número de homicídios não é decretado por lei, é sim um processo aleatório. Logo é normal que varie bastante de ano para ano (como os números o mostram), não fazendo por isso sentido atribuir alguma importância a estas variações anuais.

Nota da simulação: Processo de Poisson para cada dia do ano, de modo a que a média anual seja 154. Poisson supõe de facto independência quando na realidade há alguma correlação entre dias consecutivos (homicídios múltiplos ou viganças, por exemplo). Além de complicar as contas, incluir esta correlação só aumentaria ainda mais a probabilidade de haver "ondas de homícios".
publicado por Miguel Carvalho às 15:01
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