Quinta-feira, 16 de Abril de 2009

Afinal "quem me anda a foder"?

Na terça-feira, São José Almeida e Maria José Oliveira escrevem no Público, “Canção dos Xutos transformada em manifesto contra Sócrates”.

 
A notícia baseia-se em dois factos:
 
1. Uma montagem vídeo da TVI com imagens de Sócrates e a música dos Xutos.
 
2. Outras duas montagens em vídeo no YouTube com a mesma música, e respectivos comentários aos vídeos.
 
O facto de uma estação de televisão fazer uma montagem vídeo com uma determinada música ‘transforma’ essa música em manifesto contra alguém? Dois vídeos no YouTube são um manifesto político com escala relevante para ser notícia? Ontem de manhã nenhum dos vídeos tinha mais de umas duas mil visitas.
 
A notícia reporta ainda a opinião da banda pela voz de Zé Pedro, o guitarrista:
- Zé Pedro diz que “interpretar esta faixa (…) como um hino contra as políticas do Governo socialista é ‘deturpar’ a intenção do grupo. ‘Não há aqui alvos a abater’”
- “Zé Pedro insiste que qualquer aproveitamento da música para criticar e contestar o Governo não receberá a ‘solidariedade’ dos Xutos.”
- “Zé Pedro não tem dúvidas de que a ideia da TVI foi uma ‘deturpação’ das ‘intenções’ dos Xutos.
- “Zé Pedro, que, diz, até ‘simpatiza’ com o primeiro-ministro José Sócrates”
 
Ora, como é que com aqueles dois factos e com aquela opinião da banda, as duas experientes jornalistas e o jornal Público,
 
- decidem dar aquele título à notícia?
 
- fazem da notícia capa do Público de ontem?
 
- ocupam duas páginas inteiras dentro do jornal com a notícia?
 
- disponibilizam gratuitamente no site do jornal a música para download?
 
- e publicam na íntegra a letra da música?

 

 

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publicado por Carlos Lourenço às 11:16
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Quarta-feira, 28 de Janeiro de 2009

O que sai também pode entrar

Quarenta milhões podem perder emprego este ano no mundo diz um título do Público. Mas o texto explica que No quadro mais grave, o número de desempregados subiria para 230 milhões, mais 40 milhões do que os 190 milhões das estimativas existentes para 2008.

Estamos perante o erro da moda, confundir entradas (ou saídas) com o saldo de entradas e saídas. A acreditar no texto (a experiência mostra que é normalmente no título que está o erro) o saldo entre as pessoas que entram e que saem do desemprego serão 40 milhões este ano. Como haverá certamente muitos milhões que arranjarão emprego este ano, conclui-se que o número de pessoas que vão perder o emprego será muito maior do que os 40 milhões que o título dá a entender.

 

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publicado por Miguel Carvalho às 15:52
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Quarta-feira, 7 de Janeiro de 2009

Não compliquem, parte II

Há que ser justo: a confusão entre percentagem e ponto percentual tem sido menos frequente nos últimos tempos. Era erro habitual ler "percentagem" quando o correcto seria "ponto percentual" (como nos fartámos de escrever aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui). Exemplo: a taxa de inflação subiu 2 por cento, de 1 para 3 por cento. A taxa de inflação é ela própria uma variável expressa em percentagem, pelo que uma variação absoluta tem de ser expressa em pontos percentuais. Doutra forma, estaríamos a falar de uma variação relativa (no exemplo acima, um crescimento de 2 por cento significaria uma subida de 1 por cento para apenas 1.02 por cento).

O Público comete hoje a proeza de, pela primeira vez desde que reparo nestas coisas, (ab)usar erradamente (d)o ponto percentual: "Os funcionários públicos poderão vir a beneficiar de um aumento real do poder de compra em 1,9 pontos percentuais". Era tão simples usar ali uma percentagem, porque foi a jornalista complicar?

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publicado por Pedro Bom às 02:22
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Segunda-feira, 22 de Dezembro de 2008

Será exagero?

Sindicato garante que adesão à greve do pessoal de manutenção da TAP é superior a cem por cento.

Digamos que não é todos os dias que isto acontece!

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publicado por Oscar Carvalho às 18:48
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Domingo, 21 de Dezembro de 2008

Um belo passeio à rua sem sair de casa

No Público de hoje, o inacreditável. Lemos num título, e pasmamos, que "já não precisamos de recorrer ao crédito para nos endividarmos". E eu pergunto: mas que tipo de endividamento é que não implica recurso a crédito? Não será "endividamento", por definição, recurso a crédito?

 

Por momentos ainda pensei que pudesse estar a ser utilizada uma definição de "crédito" muito restrita, englobando apenas crédito bancário, por exemplo, mas excluindo outros tipo de crédito, como, por exemplo, o de tipo dívida de mercearia (que não deixa de ser crédito). Mas não. Reparem só no primeiro parágrafo da notícia: "Não conseguem pagar as despesas domésticas, os seguros, a creche ou a escola dos filhos, o condomínio ou a renda da casa, a conta na farmácia ou no supermercado do bairro. Não têm dívidas de crédito à habitação, automóvel, pessoal ou de qualquer outro tipo. São a nova classe de sobreendividados".

 

Ou seja, na cabeça de Ana Rita Faria, estes indivíduos têm a incrível capacidade de se "sobreendividarem" sem terem "dividas de qualquer tipo". Isto de um gajo se endividar---aliás, sobreendividar---sem se endividar é uma daquelas injustiças que deviam ser proibidas por lei. Ou isso ou proibir os jornalistas de atropelarem desta forma os conceitos lógicos mais elementares.

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publicado por Pedro Bom às 22:48
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Domingo, 30 de Novembro de 2008

E eu também nunca menti na minha vida, exceptuando isto que acabei de escrever...

Numa capa bem ao estilo do Público, lê-se hoje: "Receitas dos casinos caem pela primeira vez nos últimos 20 anos". Mas, no corpo do texto, por pressão da sua própria consciência, a jornalista Sara Felizardo lá confessa: "nunca os casinos nacionais conheceram uma diminuição tão expressiva das suas receitas como a que estão a enfrentar desde o início de Outubro, exceptuando o período compreendido entre 2003 e 2004, onde se registou uma pequena quebra (...)". Ou seja, mais uma vez, uma capa e um título que mentem com a dentição completa.

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publicado por Pedro Bom às 10:37
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Quarta-feira, 10 de Setembro de 2008

Pão para a boca

O problema com títulos e notícias simplistas (incorrectas?) é que, muito provavelmente, elas geram na população comentários e raciocínios ainda mais simplistas, passando assim ao lado da oportunidade de darem a perceber a realidade que nos rodeia e de educarem.

 

Dar como título à noticia sobre a demissão do primeiro-ministro tailandês, após um tribunal ter concluído que podia haver conflito de interesses, "Primeiro-ministro da Tailândia é demitido por apresentar programa de culinária na televisão", como faz hoje o Público, é passar ao lado do fundamental.

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publicado por Carlos Lourenço às 10:18
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Assim, de repente, seremos sempre os últimos

No Público de hoje, mais um exemplo a provar que não são as restrições sobre o espaço reservado aos títulos que justificam certas opções. No título desta notícia, sobre os resultados do estudo "Education at a Glance", reza que "Portugal é o país da UE que menos tempo dedica à língua e à Matemática". Ao ler-se o artigo, fica-se com a sensação de que se puxou a corda.

 

Parece que afinal a coisa só se refere ao 2o ciclo (5o e 6o anos), e, criticamente, apenas em relação "à língua". Isto, porque, como escreve a jornalista, "no 3o ciclo (7o, 8o, e 9o anos) apenas a Holanda apresenta uma percentagem de carga horária inferior", e, no 2o ciclo, "as escolas irlandesas dedicam tanto tempo à disciplina [Matemática] como as portuguesas".

 

Mais, o texto refere apenas a proporção de horas dedicadas às 2 disciplinas. Logo, não é necessariamente verdade que, mesmo no tempo dedicado "à lingua" (em termos absolutos), sejamos os últimos. Aliás, é referido que no 2o ciclo o número de horas obrigatórias dos alunos portugueses é mais elevado do que a média.

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publicado por Carlos Lourenço às 09:27
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Terça-feira, 9 de Setembro de 2008

Chumbada

 

Sobre a notícia da Agência Lusa publicada hoje no Público com o título “Chumbos no básico e secundário atingiram este ano o valor mais baixo da última década”:
 
1.       Tudo corria bem com a distinção entre taxas e pontos percentuais, até que lá apareceu a habitual confusão, ao referir-se que no 9º ano se registou a maior queda na taxa de chumbos -- uma queda de 7,5%. O que o(a) jornalista queria dizer era uma queda de 7,5 pontos percentuais.
 
2.       A notícia não indica se os dados se referem apenas a Portugal continental ou se inclui as ilhas. Apenas após uma pesquisa pela informação disponível no website oficial do Gabinete de Estatística e Planeamento da Educação (GEPE) do Ministério da Educação se conclui que estes se referem, provavelmente, ao continente e ilhas. Isto porque, a referirem-se apenas ao continente, as variações, em pontos percentuais, descritas no texto estão todas erradas.
 
3.       No texto, lê-se apenas sobre a taxa de chumbos. Ora, uma diminuição da taxa de chumbos de um ano para o outro não implica necessariamente uma diminuição do número de chumbos, mas apenas uma diminuição do número de chumbos em relação ao número de inscritos.
 
a.       Se o número de chumbos se mantiver constante e o número de inscritos aumentar, a taxa de chumbos diminui. Mais, a taxa de chumbos pode até diminuir com o número de chumbos a aumentar, bastando que um aumento do número de inscritos seja superior a um aumento do número de chumbos.
 
b.       De facto, extraindo informação do website do GEPE é possível verificar, por exemplo, que em Portugal (continente e ilhas) o número de inscritos no total do Secundário aumentou no ano lectivo 2006/07. Curiosamente, ainda não existe qualquer informação relativa ao número de inscritos no ano lectivo 2007/08, um ano após o início do mesmo.
 
c.        No entanto, no Portal do Governo é possível encontrar uma nota do Ministério da Educação que refere que “neste ano lectivo [2007/08] estão matriculados no ensino secundário 282 188 jovens, mais dois por cento que no lectivo anterior [2006/07]”.
 
4.       Mas então fica a questão: como se explica a discrepância dos valores, especialmente quando é possível calculá-los de diferentes formas? É que aquele número no Portal do Governo não bate certo, em diversos milhares, com nenhum dos números do relatório que é possível retirar do site do GEPE. Isto é importante porque tem efeitos no cálculo da taxa de chumbos (ou de qualquer outra taxa).
 
5.       Relativamente à polémica sobre os exames do 9º ano deste ano e à referência, na notícia em causa, ao Ministério da Educação e à Ministra (“Em Março deste ano, o ME divulgou os números relativos ao ano lectivo anterior, que também já representavam uma evolução positiva. Na altura, a ministra Maria de Lurdes Rodrigues considerou "notável" a diminuição deste indicador, atribuindo-a a medidas como o plano de acção para a Matemática e o Plano Nacional de Leitura”):
 
a.       A classificação de um aluno no 9º ano é feita de 1 a 5, em que se arredonda qualquer classificação final para a unidade mais próxima. Os exames, esses, valem 30%. Ou seja, um aluno que tenha 3 no final do 3º período, só reprova se obtiver 1 como classificação no exame e um aluno com 2 no final do 3º período, transita se obtiver um 4 no exame.
 
b.       Segundo noticiava o Público em Julho último, “a percentagem de notas de nível 5 (a mais alta) subiu de 1,4 por cento para 8,3 por cento. As classificações equivalentes a Bom (nível 4) dispararam de oito por cento para 21,4. (...) A classificação mais baixa de todas (nível 1), por exemplo, foi atribuída a apenas 3,3 por cento. Em 2007, foram 25 por cento a ter esta nota.”
 
c.        Comparar taxas, sejam elas de reprovação ou de outra coisa qualquer, só faz sentido se for possível comparar níveis de dificuldade das provas. E a melhor forma de averiguar a dificuldade das provas é, provavelmente, perguntando aos alunos, ou pedindo-lhes que realizem uma prova de um ano anterior. Nem precisa de ser a todos, basta uma amostra representativa. A este respeito ver, por exemplo, este artigo no Daily News.
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publicado por Carlos Lourenço às 13:03
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