Sexta-feira, 10 de Abril de 2009

Resposta antiga do Público II

Aqui fica a mais que tardia resposta, a uma réplica de Sérgio Aníbal proporcionada pelo Provedor do Público depois de um contacto meu semelhante a este post.
Como agradecimento ao tempo perdido com a resposta, e por ser um assunto recorrente mas de difícil explicação, dei-me ao trabalho de adaptar um ficheiro com um exemplo antigo a esta questão em concreto. O ficheiro está aqui em formato standard internacional ISO, e aqui em formato .xls para quem usa software com incompatibilidade.

> O leitor tem toda a razão. Na 1ª pág. nunca deveria ter sido escrito que as conclusões surgem num relatório do INE, é falso. No meu texto isso nunca é afirmado, os cálculos são meus, utilizando dados do INE.

Uma nota ao provedor: já se tornou um hábito nas respostas aqui presentes dos jornalistas, haver um reconhecimento de um erro na capa e nos títulos. O facto de o corpo do texto estar correcto não me parece que deva ser dado como atenuante do primeiro erro. Como sabemos a maioria absolutíssima retem as manchetes e não as frases perdidas no texto.

Repito os dois erros técnicos no artigo:

A. Mistura de fontes diferentes
Isto é metodologicamente errado. Se eu quero saber quanto custa fazer uma salada de feijão com cogumelos, devo somar o preço do feijão e dos cogumelos. Imagine-se que eu sei exactamente quanto custa o feijão no Porto (imagine-se que mais barato do que em Lisboa), e exactamente quanto custam os cogumelos em Lisboa (mais barato do que no Porto). Eu não devo somar os dois porque obteria um preço muito baixo mas irreal porque ninguém compra dessas duas fontes. Devo é somar dados maus (mas não-enviesados) dos cogumelos e bons do feijão no Porto (e dizer que fiz as contas para o Porto), ou o mesmo para Lisboa.

B. Agregação: aqui não um erro metodológico em si, mas os resultados obtidos são de tão fraca qualidade que não os deveremos levar a sério, muito menos fazer manchetes de jornais.
O rácio entre despesas em feijão/despesas em cogumelos Shitake é diferente para consumidores pobres e consumidores ricos. Quando não sabemos estes detalhes, sabendo apenas as despesas dos pobres e dos ricos em alimentação no geral, e estamos perante uma variação de preços diferentes no feijão e nos cogumelos, é muito complicado dizer qual foi realmente a variação de preços para uns e outros.
Mesmo sem quaisquer erros de medição, mesmo sem a mistura de fontes, mesmo assumindo quantidades fixas por consumidor, por categoria e por subcategoria (3 hipóteses!), estas taxas de inflação para cada tipo de consumidor calculadas pelo método de S.A. (a vermelho) são muito diferentes das reais (a azul).

>>Antes de mais um fenómeno paranormal nos resultados de Sérgio Aníbal, que lhe deveria ter saltado à vista. TODAS as classes de rendimento sofreram, segundo ele, inflações iguais ou acima da inflação! Ou seja teremos a média (feita sobre os rendimentos) acima da média. Algo com a média de 10, 9, 8, 7, 6 e 5 ser... 5! O que já mostra que as suas contas estão certamente erradas.

>Não há qualquer fenómeno paranormal. Como é explicado no texto, o cálculo da inflação por classes de rendimento que é feito utiliza os pesos na despesa familiar obtidos no inquérito aos orçamentos das famílias 2005/2006. O INE utiliza ainda os pesos obtidos no inquérito de 2000. Por isso, como penso que é referido no texto, e como escrevi num anterior artigo meu, o valor da inflação global usando os orçamentos 2005/2006 é superior à taxa de inflação oficial declarada pelo INE.

1. Claro que há um fenómeno paranormal. A média das médias tem que ser (quase) igual à média absoluta. No ficheiro o número a verde e o a roxo têm que ser (quase) iguais.

2. Sérgio Aníbal diz que não... porque mistura valores de fontes diferentes, neste caso pesos de despesas de 2000 e variações de preços de 2005/06. Na variação do preço da alimentação calculada pelo INE, está incluida a quantidade que o pobre comprava de feijão em 2000. No peso da alimentação no consumo, está incluida a quantidade de feijão que o pobre comprava em 2005/06. Quando S.A. multiplica um pelo outro, está a misturar a mesma variável retirada de fontes diferentes.
Como disse em A., quando usamos um método errado é óbvio que os resultados são errados, e logo não obedecem a propriedades gerais que os resultados correctos obedecem. O que eu escrevi foi, o não cumprimento dessa propriedade indicia que o método era errado, seja pela razão A ou pela B. S.A. diz que não era de esperar esse cumprimento, porque foi usado um método errado. Estamos de acordo. Só não percebo porque não parou aqui, e escreveu o artigo todo.

3. Taxa de inflação superior
Aqui o problema em usar fontes diferentes para a mesma coisa fica muito claro. S.A. diz que a inflação do INE está errada porque usa dados de 2000. Mas para provar a sua tese, ele usa as variações de preços calculados pelo INE, onde esses mesmos dados de 2000 são usados! Isto apenas prova que há inconsistência nos dados (mas isto é óbvio e incontornável), não prova que lado está certo.
Se alguém hoje diz hoje X e amanhã Y, eu sei que ele mentiu. Agora não posso dizer "X é errado, porque ele disse Y", porque poderia fazer exactamente o contrário.
No ficheiro dou dois exemplos simulando os cálculos do artigo. Um onde X estava mais perto da verdade, e outro onde Y estava mais perto. Comparar os valores a castanho e cinzento com o verde (verdadeiro).

>>Apesar de ter que reconhecer que Sérgio Aníbal se deu ao trabalho de fazer algo que provavelmente poucos fariam, não se pode tirar as conclusões que ele tira. Mais uma vez e bem, ele próprio reconhece isso dizendo: "A análise feita pelo PÚBLICO não leva em conta esse nível de desagregação da despesa familiar..." Mas logo a seguir
estraga tudo mostrando bem o seu facciosismo, quando diz: "Ainda poderia acentuar as disparidades do impacto da inflação sobre os diferentes tipos de famílias". Dou-lhe razão, mas não há razão nenhuma para acreditar que seja para cima ou para baixo. Por que será que não escreveu o oposto, que poderia diminuir e até inverter as disparidades do impacto da inflação? Não dava jeito. Como exemplo posso indicar os legumes, que desceram 15%, o que mostra o quão difícil é tirar o tipo de conclusões que o Sérgio quer tirar, com os poucos dados disponíveis que existem.

>Eu estou convicto (foi por isso que escrevi e não por facciosismo, como diz o leitor mostrando como assume que qualquer jornalista está, por princípio, sempre pronto a ldrabar) que, mesmo desagregando, as famílias mais pobres poderiam sair mais prejudicadas. O leitor dá o exemplo dos legumes, mas a verdade é que as maiores subidas (pão, arroz, leite, ovos, massas) são tudo bens a que com toda a probabilidade as famílias mais pobres dão uma maior importância no seu orçamento. De qualquer forma, compreendo a crítica, deveria estar mais claro que é apenas uma convicção do jornalista. Esta questão tem, no entanto, pouca importância na conclusão principal do texto.

4. Facciosismo
O S.A. tem razão para se sentir ofendido, porque facciosismo não é uma acusação simpática. Mas eu concretizei e fundamentei a minha acusação. Agora, a partir de um ÚNICO exemplo relacionado com um ÚNICO jornalista S.A. acusa-me de ASSUMIR (note-se que eu fundamentei a minha crítica) que TODOS os jornalistas estão SEMPRE prontos aladrabar. Três generalizações de uma vez só. Quanto a ofensas gratuitas estamos conversados.


5. Quanto à convicção de S.A. não me devo sequer pronunciar, porque cada um tem a sua. Nunca quis comentar a opinião de ninguém, apenas comento conclusões que acho erradas. Eu próprio não faço a mínima ideia se a coisa subiria ou não.
Quanto à minha crítica anterior, onde dizia que os cálculos feitos no artigo não permitem a conclusão de que os pobres sofrem taxas de inflação mais altas, dou no ficheiro um exemplo (vermelho) onde o cálculo do Público concluiria isso, mas a realidade seria a oposta.

>> Outro aspecto que mostra o quão forçadas são as suas conclusões é o facto de ele chegar ao valor de 3,1% de inflação para as famílias ricas e 3,6% para as pobres. A diferença é ridiculamente baixa e insignificante dados os problemas de agregação. Mais, esta pequeníssima diferença que foi medida em Março (0.5 pp) pode pura e
simplesmente inverter-se em Abril, já que a inflação dentro de cada classe de produtos é altamente volátil (com variações de mais de 1 pp de mês para mês em termos anuais).

> Não considero a diferença ridiculamente baixa e insignificante.

6. Fico na dúvida se me expliquei bem.
Eu não quis dizer que os 0,5% são insignificantes, se assumirmos que são verdadeiros. A questão é, mesmo contando apenas com o problema B, isto é descontando todos os outros erros, estes 0,5% não são minimamente fidedignos. Veja-se a grande diferença entre os valores a vermelho (com erro B) e a azul (reais)! A minha crítica principal passa exactamente por aqui. A manchete do Público é baseada nos primeiros mas a realidade são os segundos.

7. E repito, a isto somam-se os outros erros, e o facto de terem sido apenas usados dados de um mês. No mês seguinte, as conclusões seriam provavelmente outras, ao contrário do que dá a entender a manchete do Público.

> O objectivo principal do texto foi o de comparar qual a inflação registada para uma distribuição da despesa de uma família de baixo rendimento e de outra de elevado rendimento. Os números mostram que ela é maior para os mais pobres, precisamente porque estas famílias gastam proporcionalmente mais em alimentação e habitação, classes em que os preços têm subido mais. Há sempre limitações neste tipo de cálculos, mas penso que as conclusões são correctas e não contêm qualquer tipo de sensacionalismo, que nunca foi o objectivo do texto quando decidimos realizá-lo.

8. Quanto aos "números mostram" já disse tudo o que tinha a dizer.

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publicado por Miguel Carvalho às 22:47
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Quinta-feira, 19 de Março de 2009

Resposta antiga do Público

Por desleixo meu não cheguei a responder a uma réplica antiga do Sérgio Aníbal do Público a um post meu, onde o acusava de inventar uma contradição. Acrescente-se que a réplica aconteceu por intermédio do provedor do Público, a quem se deve aliás a maioria das reposta que este blog já recebeu.

 

O tema já é antigo, mas vale a pena ler a minha resposta:

 

1. Alega o leitor que é isso que está em causa (ou seja, o que se passará neste ano e no próximo) e que para esse período o FMI não aponta outros factores na evolução da situação nacional.
Não é uma alegação, é uma constatação de um facto. O Público diz  "A crise internacional não é a principal causa para o ritmo de crescimento lento que Portugal irá continuar a apresentar neste ano e no próximo, ao contrário do que tem vindo a ser defendido pelo Governo. A garantia é dada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI)".
Volto pois a citar a frase do FMI: "Growth will likely slow in 2008 to about 1¼ percent, and to about 1 percent in 2009, driven by weaker partner country growth, the international financial turbulence, and higher commodity prices."
Repare, ambos os textos referem os próximos dois anos. O do Público diz que a causa não é a crise internacional, o FMI refere três causas, todas internacionais. Contradição mais explícita não poderia haver.

2. Conclui por isso o jornalista, solicitado pelo provedor a esclarecer o assunto: “Assim, o FMI considera que, apesar de haver problemas conjunturais (externos) a afectar Portugal, são os problemas estruturais (internos) que mais estão a limitar o crescimento da economia. O Governo, por seu lado, tem salientado no seu discurso que os problemas estruturais (internos) estão a ser resolvidos pelas políticas postas em prática e que são os problemas conjunturais (externos) o principal entrave ao crescimento da economia. ‘Estamos agora melhor preparados para enfrentar a crise’, tem sido a frase mais utilizada pelos membros do Governo. Foi aqui, quando escrevi o artigo, que encontrei a contradição.
Estamos de acordo. São problemas internos que estão a limitar o crescimento. Também estamos de acordo que o governo tem dito que os problemas "estão a ser resolvidos". Há alguma contradição entre "estar a ser melhorado" e "estar mau", como afirma agora Sérgio Aníbal? Concorda com a afirmação "a economia angolana está mal, mas está a ser melhorada"? Se concorda, perceberá que não ali contradição nenhuma.

3. E, ao citar aquela frase do relatório, referi igualmente a existência de problemas conjunturais externos, ao contrário do que diz o leitor.
Não admito que me chamem mentiroso! Desafio-lhe a mostrar onde é que eu o acusei de não referir problemas externos.

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publicado por Miguel Carvalho às 23:40
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Quarta-feira, 9 de Abril de 2008

Resposta do Provedor do Público II

Recebi uma resposta do Público referente a este post. A resposta da jornalista pode ser lida aqui. Resumo das minhas críticas, resposta da jornalista e minha contra-resposta:

No texto lê-se "acréscimo de emprego registado em 2006 - a primeira subida em três anos", quando no gráfico houve vários crescimentos. Afinal o gráfico da notícia referia-se a emprego total por conta de outrem e o texto da notícia referia-se a emprego "total total" (por conta de outrem e por conta própria). Infelizmente não tenho o original (se alguém tiver assinatura, agradeceria muito que me deixassem aqui o texto) para verificar se o leitor foi induzido em erro. De qualquer modo, mesmo o emprego "total total" teve um aumento ligeiro em 2004 (que a jornalista diz que é estagnação) e uma estagnação em 2005, logo chamar-lhe "a primeira subida em três anos", induz o leitor em erro.

Na notícia diz-se que há uma tendência da "criação de emprego (..) ser feita sobretudo via contratos a prazo", quando o gráfico mostra exactamente o contrário de 2002 a 2005. A resposta não é muito clara, mas passa por dizer que o número de novos empregos em 2006 eram maioritariamente a prazo, sem nunca referir o que aconteceu de 2002 a 2005. Na realidade o número de empregos a prazo destruídos foram mais que os criados, e empregos sem termo foram mais os criados que os destruídos. Logo de 2002 a 2005 o emprego foi criado (em termos líquidos) via contratos sem termo!
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publicado por Miguel Carvalho às 12:22
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