Hoje na SIC e SICNotícias ouve-se os seguintes disparates (não é literal, mas a ideia era essa)
Número de desempregados aumentou 27,3% em relação a Janeiro de 2008
Na suposta fonte da notícia, um relatório do IEFP, lê-se que o número de desempregados variou +12,1%. Habituado à confusão de muitos jornalistas entre stock e fluxo, imaginei que tivesse sido a variação do número de desempregados que aumentou 27,3%. Mas também não é, o relatório não tem dados que possam calcular essa variação. Os 27,3% referem-se sim à variação do número de novos trabalhadores inscritos como desempregados. O problema é que não há nenhuma relação directa entre este número e o número de desempregados. Pode haver um aumento do número de novas inscrições e o desemprego descer. (Não é o caso, claro! Mas mostra como se confunde coisas com pouca relação entre si)
Portugal ganhou 70 mil novos desempregados
Aqui o computador diz que 448 menos 416 dá 32, mas a SIC lá saberá onde inventou os 70.
(Adenda: reler este post e os comentários a ele para perceber o que quero dizer com este ponto)
Cada vez mais cursos deixam de ser garantia de trabalho
Quem lançou esta notícia foi o JN, onde se lê que há menos 4% (em número absoluto) de licenciados desempregados. Ora num clima de aumento de desemprego, a existência de menos licenciados desempregados a levar a alguma conclusão seria exactamente a oposta do que a SIC diz!
Os cursos que dão menos garantia de trabalho são Psicologia, Gestão, etc.
Há muito mais pobres nos EUA do que no Tuvalu, mas isso é porque o Tuvalu é pequeno, não é porque os norte-americanos tenham maior probabilidade de ser pobres. Se houver 5 médicos desempregados, e a licenciatura em Engenharia de Descascadores de Batatas tiver todos os seus 4 licenciados no desemprego, a SIC diria que a licenciatura em Medicina garante menos emprego... pois.
Os telejornais gostam muito de reportagens com jornalistas de calculadora na mão, a fazer umas contas sobre os gastos dos portugueses (exemplo antigo aqui). No jornal da noite da SIC de anteontem, Pedro Andersson propunha métodos de poupança. Deixando de gastar x no pequeno almoço no café, poupava-se os mesmos x. Não comendo o almoço no restaurante que custa y, trazendo sim algo de casa, poupa-se y, etc. Aparentemente esqueceu-se que as refeições em casa também custam dinheiro, conseguindo assim um valor de poupança astronómica graças às suas propostas.
Claro que os espectadores repararam no óbvio, que as contas não faziam sentido. A questão aqui é, será que o jornalista não reparou ou tendo reparado achou que era "giro" fazer as contas na mesma?
A SIC anuncia hoje uma reportagem onde o pivot diz que a crise e a subida do custo de vida têm obrigado as pessoas a levantar as suas poupanças. Para provar a tese referem os numerosos levantamentos de certificados de aforro nos últimos tempos.
Os jornalistas da SIC aparentmente não estão a par do forte corte nas taxas de juros dos certificados de aforro, que o Governo decretou há meses. Só se as pessoas fossem estúpidas, é que este levantamento não teria acontecido - haja crise ou bonança. Os entrevistados referem explicitamente a questão da queda das taxas de juro, para explicarem a situação. Mas o que é que isso interessa, quando podemos sempre dizer que é a crise?
Não estou a dizer que não haja uma diminuição na poupança, porque não faço a mínima ideia dos valores. Mas quem deveria ter as mesmas dúvidas que eu, e quem deveria ter verificado os dados da poupança antes de cair em sensacionalismos, deveria ter sido a SIC.
Há cada vez mais queixas na Saúde, diz a SIC. Em letra mais pequenas: É um aumento de 476%, quase cinco vezes mais, em relação a 2006.
Não, não são dados de um estudo.
Trata-se apenas do número de queixas apresentadas à ERS, que subiu. Não se trata nem do número total de queixas, nem sequer envolve queixas que tenham passado pela Inspecção-Geral das Actividades em Saúde. Se no seu geral as queixas (formais ou não) subiram ou desceram não faço a mínima ideia... mas a SIC também não saberá de certeza.
Ah, e resta acrescentar que a ERS começou a funcionar em... 2006! Se não tivesse havido um aumento em 2007 é que seria de estranhar!
Adenda graças do Pedro Bom: Também gostei muito da parte dos 476%, que supostamente resulta em quase "cinco vezes mais" do que em 2006. Como é "quase 500%", é "quase 5 vezes mais", assim como se fosse "quase 100%" seria "quase uma 1 vez mais"... Não, não é quase 5 vezes mais, é MAIS do que 5 vezes mais, é quase 6 vezes mais! Se mete percentagens...
Adenda minha: Impressionante como um artigo com umas 10 frases tem tanto disparate. Mais outro: "Os portugueses estão cada vez mais descontentes com o Sistema Nacional de Saúde." Como já escrevi em cima isto é uma generalização abusiva, porque estamos a falar de uma fracção das queixas, e acrescento porque mais queixas formalizadas não implica mais descontentamento. Mas o curioso é outra frase a seguir "A maioria dos protestos dirige-se aos privados, com 78% das queixas." Ui! É cá um descontentamento com o serviço público, que não te falo!
Se ficaram com medo de ir a Loures porque a criminalidade violenta e indiscriminada disparou, podem ficar descansados! Oiçam o resto:
Diz a locutora: "Mulher baleada por um desconhecido.........a juntar a esta morte, refira-se que houve também esta semana um homem que morreu numa rixa num café em Camarate e um homem que matou os pais e suicidou-se a seguir"...
Somar eventos de natureza diferente não faz sentido nenhum, a não ser que o objectivo seja empolar sentimentos de insegurança.
A SIC na sua ânsia cega de sensacionalismo brindou-nos ontem com uma reportagem onde se lia em letras gordas "Aumentos. Preços sobem acima da inflação".
Quase todos os meios de comunicação repetiram a mentira que nem uns carneirinhos, sem se darem ao trabalho de verificar a informação. TVI, Correio da Manhã, SIC, Record e TSF, pelo que pude ver no Google News. Mas o meu maior escárnio vai para a imprensa dita económica, que deveria saber o mínimo dos mínimos: Agência Financeira, Portugal Diário, Jornal de Negócios, Diário Económico. Todos repetem a mesma mentira. Uma vergonha de jornalismo.
Os meus enormes parabéns à LUSA, ao DN e ao Público (versão papel) por terem escrito a verdade.
Adenda: Não só mentem em relação a estes dados, como muitos (como o CM) referem que o PIB per capita "voltou a descer". Outra mentira! De 2004 para 2005 também subiu.
Adenda: O prémio do meio de comunicação mais imaginativo vai para a Agência Financeira. Os números do relatório em causa são todos em percentagem da média da UE. Ou seja, toma-se o valor médio do PIB per capita em PPP naquele ano como o valor de referência 100, e os outros são dados em comparação com o 100. Portugal, por exemplo, tem 75. Apesar de os valores se referir a esse valor fixo 100, aparentemente a Agência Financeira ainda consegue inventar aí uma tendência (deve ser do 100 para o 100) e escreve no título "Poder de compra dos portugueses cai e contraria tendência europeia". (Admito que se possam estar a referer a outra tendência, porque não são claros, e não explicitam essa afirmação no texto).
Adenda: acabei de rever a peça da RTP. Além de vários pequenos erros, parece confundir os valores da percentagem face à média europeia com a sua variação (refere alguns países que estão agora melhor, citando para tal de seguida os seus valores... mas os valores não indicam variação). E mais uma vez se comprova que os jornalistas se seguem uns aos outros que nem uns carneirinhos: a reportagem volta a referir (como o DD) que os cálculos "deixaram a inflação de fora". Como já escrevi, é o nível de preços que é contornado, e não a inflação. Além disso, por definição, os valores do PIB dados pelo Eurostat são dados em paridades de poder de compra, não é novidade nenhuma!
Como diz o entrevistado com muita razão, em Portugal sabe-se muito pouco dos nossos irmãos galegos. Eu acrescentaria que se sabe pouco da nossa história comum e por consequência da história de Portugal. O "tradutor" (não faz muito sentido chamar tradução do galego para o português) da reportagem é um excelente exemplo disto chegando ao ponto de confundir Galécia (província romana onde se encontrava todo o Norte de Portugal) com Galiza (por volta do minuto 2:40).
Grande parte da reportagem de hoje na SIC sobre o anúncio da data de reabertura do túnel do Rossio, era dedicada a algo que à primeira vista parece uma barbaridade: o túnel renovado terá uma saída de emergência a meio mas esta não está preparada para deficientes motores. Além dos comentários ao estilo "só neste país", há ainda uma emocionante cena em que o jornalista coloca o presidente (?) da REFER entre a espada e a parede ao perguntar, bem ao estilo do jornalista-herói que desmascara o malfeitor , o porquê desta discriminação. O pobre homem balbucia um pouco e não sabe responder. Há ainda alguém que comenta que os elevadores não podem ser utilizados em caso de emergência, mas o jornalista insiste e o pobre homem não tem resposta. Uma pergunta inocente: alguém alguma vez viu em algum país saídas de emergência preparadas para deficientes?
António José Teixeira na SIC disse há instantes na SIC que Portugal tinha descido algumas "posições no nível da transparência (sic)" (referindo-se provavelmente ao ranking de corupção feito pela Transparency International), o que "quer dizer que o fenómeno se agravou". Este simplismo com que são tiradas estas conclusões é revoltante. Por exemplo, em termos de PIB per capita sabemos que Portugal desceu algumas posições no ranking nos últimos 10 anos. Passa pela cabeça de alguém concluir que o PIB per capita desceu neste período??