Como previ neste post de domingo, a principal notícia da capa do SOL de sábado não tem qualquer fundamento. Só hoje pude confirmar que a notícia no interior não continha mais informação do que aquela que aparece na capa.
O único dado concreto na notícia é a detecção de um trojan (algo semelhante a um vírus informático) num computador. Como qualquer utilizador experiente de computadores (descontando os de Linux e MacOS) sabe, estes "ataques" de malware são algo muito frequente e que (quase) nunca são cometidos deliberadamente por uma pessoa concreta contra um computador concreto. Os trojans e os vírus espalham-se sem qualquer participação activa de algum "pirata". Custa a acreditar que há alguém específico por detrás de cada um dos 100 "ataques" que o anti-vírus e a firewall do Hugo de Freixo de Espada à Cinta detectou nos últimos tempos. Seria necessário uma batalhão de milhões "piratas" a trabalhar a tempo inteiro para que todos tivessem causa humana deliberada. Assim, afirmar com base nos factos apresentados, que um "Pirata atacou ficheiros da Procuradoria" como faz o SOL em letras gigantes, é no mínimo fantasioso.
Além de trojan não ser tecnicamente um vírus, hacker não é o equivalente inglês de "pirata informático" como aparece na capa do SOL. Mas isso são detalhes insignificantes.
O jornal humorístico 24 Horas, concorrente fraquinho do Inimigo Público de onde roubei o título do post, diz hoje na capa: Portugal é o país da Europa com maior taxa de homicídio. Relatório da ONU preocupante. O mais grave não é,
- deixar a ideia na capa de que se tratam de números actuais
- nem generalizar os dados de um ano só, quando eles são muitos voláteis (em 2006, o ano escolhido pelo 24 Horas, a taxa foi de 2,15 mas tinha sido 1,66 no ano anterior e terá sido algo como 1,6 no ano seguinte pelo que percebo do texto do jornal),
- nem "esquecer" que países como França, Bélgica, Luxemburgo, Hungria, Bulgária, Islândia etc. (salvo o erro são países europeus), não constam do relatório,
- nem "esquecer" que as definições jurídicas de homicídio, e logo as estatísticas em si, não são comparáveis entre países*.
O mais grave é haver vários países europeus (Bielorrússia, Estónia, Letónia, Lituânia, Mónaco) onde a taxa de homicídio foi mesmo maior do que a nossa no ano escolhido pelo 24 Horas. E isto não os impediu de escolherem o título que escolheram.
Depois há o SOL que faz copy-paste do 24 Horas sem se dar ao trabalho de verificar os dados. O Público além de se esquecer no título da França, Bélgica e Luxemburgo, deve julgar que o Mónaco é um país nas Caraíbas.
*Normalmente não faria esta crítica, porque o jornalista não é obrigado a saber este pormenor. Normalmente diria que a tarefa do jornalista é apenas usar os números da fontes. Mas neste caso, é o próprio corpo da notícia que diz que os números não são comparáveis.
Título na capa do SOL: Baixou o consumo de electricidade. (O bold é do próprio SOL)
Trata-se pela 1001ª vez do disparate de confundir subida mais lenta com uma descida. O texto explica que o consumo "vinha a crescer" 4% e o crescimento caiu para 1%.
Eu sei que é complicado perceber para quem não tem a 4ª classe, mas eu tento explicar. Quando do 100, se cresce 1%, passa-se para 101. E 101 é maior do que 100, logo cresceu. Qualquer dúvida, escrevam aqui para o blogue.
Défice externo vai consumir todo o PIB em 2010 diz a capa do SOL.
É impressionante que depois de tantos anos a falar no défice orçamental, ainda haja quem não tenha percebido a diferença entre défice e dívida. Se eu disser que o défice orçamental anda acima dos 60% até as criancinhas sabem que eu estou a cometer um erro. Pelos vistos alguém no corpo editorial do SOL até concordaria.
A expressão "vai consumir todo o PIB" também tem o seu encanto. Primeiro porque dá a entender, em mais um exemplo de sensacionalismo barato, que tudo o que produzimos vai ser levado. Ou seja não se confunde só dívida com défice, como também se confunde dívida com o seu pagamento. Segundo porque prova que a troca de "dívida" e "défice" não foi uma simples distracção, mas é causada por desconhecimento.
No texto (da capa, que eu não vou gastar 2,5€ para poder ler o interior do bicho) temos "... ficando o país totalmente hipotecado ao estrangeiro". Ai, ai... Se eu ganho 10 e peço um empréstimo de 100 para comprar uma casa de 100, pela lógica da batata (ou do nabo) do SOL, eu estaria totalmente hipotecado 10 vezes...
Na edição online ainda se vê um subtítulo "Todo o valor de Portugal", referindo-se aos 100% do PIB. Esta gente não faz a mínima ideia o que é isso do PIB. Mais uma vez, se eu tiver 20 moradias, 100 automóveis, 20 iates, um saca-rolhas de plástico e 10 castelos do Playmobil, mas tiver também o azar de ter sido despedido, qualquer criancinha diria que eu sou rico (pelos castelos, claro). Para o corpo editorial do SOL, não. Os valores que eu possuo resumem-se ao subsídio de desemprego.
Do leitor J.N.
A propósito de uma entrevista do SOL à Helena Roseta, onde ela fez questão de sublinhar que tinha feito um acordo entre ela, como vereadora, e o presidente da Câmara sobre questões da habitação no concelho, a capa do SOL diz que "Helena Costa (...) concluiu um acordo com o PS", ou seja com o partido (ligando até implicitamente o acordo ao apoio de HR a Manuel Alegre nas presidenciais...).
Mais dados sobre o Inquérito Nacional sobre a Violência de Género, e mais uns exemplos sobre a ligeireza com que se enchem páginas de jornais com números falsos.
Ioli Campos no SOL: O único tipo de violência contra as mulheres que aumentou foi a agressão psicológica (53,9%); a violência física (22,6%) e a sexual (19,1%) decresceu no período em análise.
José Bento Amaro no Público: Entre os três tipos de violência analisados no inquérito de 2007, apenas os casos de violência sexual diminuíram. Ainda assim, a sua prevalência em relação ao total apurado é de 27,5 por cento (...) cerca de uma em cada quatro mulheres.
1. Só nestas frases já sabemos que há (pelo menos) dois erros, porque os jornalistas contrariam-se duas vezes. (Imagino que a diferença entre os 19,1 e os 27,5, seja explicada pelo primeiro ser a percentagem dentro da violência que foi sexual, e o segundo a percentagem dentro das mulheres vítimas que se queixam de violência sexual, mas como os jornais trocam tudo não o posso confirmar).
2. Há também ali mais um erro, é que aquelas percentagens não são percentagens globais, são apenas dentro das mulheres que se declararam vítimas. Por exemplo, se 2% se declaram vítima, e dentro dessas 50% declaram-se vítimas de violência sexual, apenas 1% das mulheres foram vítimas e não 50% como nos apresentam. Para que não haja dúvidas que é esta a mensagem que é passada, aqui ficam as letras gordas do Público: "Uma em cada quatro mulheres foi molestada sexualmente". Ora, segundo os números na tabela do Público este número foi de 7%! Fazendo as contas com os 27,5%, foram 10%. O título é portanto falso.
3. Por último, o nosso erro matemático de estimação. Diz a Eduarda Ferreira no JN, desceu cerca de 10% (...) o número de portugueses que afirmam ter sido vítimas de violência. Ora uma descida de 48% para 38,1%, é uma descida de 21%. Para que a Eduarda fique a pensar: se de 20% para 10% vai metade, e metade é 50%, por que é que a Eduarda teria dito 10% de diminuição?
Chegado por e-mail
Mais um exemplo de uma notícia onde o título inventa uma confissão que depois não é secundada pelo texto. Diz hoje o SOL que "Olmert disse: «Nunca recebi subornos. Nunca»". Mais à frente "Numa comunicação que durou seis minutos, Olmert confirmou que recebeu dinheiro do investidor nova-iorquino Morris Talansky, mas insistiu que se tratava apenas de doações para financiar a sua campanha de reeleição à câmara da cidade e à liderança do partido Likud.".
Qual o título que o SOL escolhe? "Olmert admite receber subornos mas recusa renunciar ao cargo"!!
Não está em causa se aqueles fundos eram suborno ou não, não está em causa a ética do senhor. O que está em causa é que o SOL viu uma confissão onde ele não existe.
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